segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

EMBARGOS DE TERCEIRO - MEAÇÃO

Processo n.º 0000/2008
Embargante: M. A.
Embargada: S.S.
Embargos de Terceiro

Vistos etc.

M. A., já qualificada, inconformada com a penhora efetivada às fls. 176/177 (autos de n. 17024/2006), interpôs embargos de terceiro, contra S. S. representada por S. D. devidamente qualificadas nos autos, em razão dos seguintes fatos:

Relata a requerente, em síntese, que os bens penhorados nos autos da ação de execução provisória que a embargada move contra seu marido, também lhes pertencem, uma vez que casada sob o regime de comunhão universal de bens, razão pela qual devem ser totalmente excluídos da penhora.

Afirma que não pode ter seus bens expropriados em decorrência da inadimplência exclusiva do marido, com a qual não participou e não obteve nenhum proveito, não tendo sido contraída em benefício da sociedade conjugal.

Coleciona inúmeros julgados e justifica seu pedido com fundamento no artigo 1.046 do Código de Processo Civil. Pugna, assim, pela procedência do pedido, com a conseqüente exclusão dos imóveis da expropriação nos mencionados autos.

Juntou os documentos de fls. 17/38. Contestação às fls. 52/54.
Às fls. 66 e 101 dos autos, foi indeferido o pedido de suspensão do feito principal, uma vez que apesar da propriedade em comum, a metade dos bens ou seu valor correspondente seriam reservados por ocasião da hasta pública, o que não prejudicaria o direito da embargante.

Inconformada, a embargada interpôs agravo de instrumento, como se vê pela cópia juntada às fls. 77/100.

Com vista dos autos, a representante do Ministério Público, opinou pela procedência parcial do pedido, conforme parecer de fls. 107.

É o relatório. Decido.

Almeja a requerente ver seu bens excluídos da penhora efetuada contra seu cônjuge, em virtude de condenação decorrente dos autos da ação de investigação de paternidade c/c alimentos (n. 3362/2000), na qual figura como investigante a embargada.

Com efeito, a existência dos embargos de terceiro se deve exclusivamente ao fato de que os efeitos do processo não devem, via de regra, atingir esfera jurídica de terceiros.

Reconhece-se, assim, por via inversa, que pode ocorrer (e às vezes com freqüência), a prática de ato judicial de apreensão de bens que atinja bem pertencente a quem não é parte do processo, caso em que deve ser eliminado da constrição, por ofensa ao princípio do devido processo legal[1].

Freitas Câmara, citando Theodoro Júnior[2], é enfático ao ensinar que:
[...] ultrapassando o limite da responsabilidade executiva do devedor (art. 591), e sendo atingidos bens de quem não é sujeito do processo, comete o poder jurisdicional, esbulho judicial que, evidentemente, não haverá de prevalecer em detrimento de quem se viu, ilegitimamente, prejudicado pela execução forçada movida contra outrem.

Ocorre que, no presente caso, é notório que a embargante não detém total razão. Depreende-se dos autos que esta tem direito tão somente à metade dos bens elencados e não à sua totalidade, preceito lógico do regime de comunhão universal de bens, do qual a sociedade conjugal faz parte.
Nesse regime, não há bens particulares ou futuros, comunicando-se todos os bens do casal, salvo algumas exceções previstas no artigo 1.668 do Código Civil, de forma que o cônjuge se torna meeiro de todo o patrimônio que for adquirido por qualquer dos consortes e não proprietário único.

A conseqüência disso é que a requerente só pode dispor e requerer a exclusão da metade dos bens penhorados e não da sua totalidade. Não pode a autora, em prejuízo do direito da alimentanda, reivindicar parte do patrimônio que não lhe pertence e que naturalmente deve ser responsável pelo pagamento do débito.

Assim, desde que respeitada a meação da suplicante, os bens indicados podem perfeitamente ser expropriados, não havendo razão para sua exclusão da fase executiva. Esse é o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves[3]:

[...] Decidiu o Superior Tribunal de Justiça que “os bens indivisíveis, de propriedade comum decorrente do regime de comunhão no casamento, na execução podem ser levados à hasta pública por inteiro, reservando-se á esposa a metade do preço alcançado”.

Note-se que os bens indicados correspondem a 02 (duas) salas no edifício Palmares e mais uma garagem, o que traz a possibilidade de serem divididos igualitariamente, o que de fato, restou caracterizado nos presentes autos.

Deste modo, apesar de penhorados todos os três bens indicados (fls. 176/177), somente foi deferido o pedido de adjudicação em favor da alimentanda de 01 (uma) sala comercial (n. 1008), consoante se vê pelas decisões de fl. 212 (proc. 0000/2006) e de fl. 101 (proc. 15988/2008), ficando resguardada à embargante a propriedade da outra (sala n. 1004), restando pendente de deliberação apenas a situação do outro bem (garagem n. 217).

Portanto, observa-se que foram respeitados todos os direitos da embargante, durante o processo de execução, de modo que não se vislumbra qualquer prejuízo que justifique a interposição dos presentes embargos.

O que não se pode permitir é que a menor em questão, já prejudicada pelo inadimplemento da obrigação, sofra ainda mais com a suspensão do processo, cuja causa deve-se exclusivamente à inadimplência do devedor.

A obrigação de alimentos, tutelada inclusive constitucionalmente, não pode ficar condicionada às artimanhas do devedor, muito menos às formalidade legais (art. 1.052 CPC[4]), que impedem o cumprimento imediato da obrigação alimentar (de natureza imprescindível), devendo ser interpretadas em conjunto com as disposições constitucionais atinentes à dignidade da pessoa humana, à vida, aos alimentos e à proteção aos filhos.

Com efeito, a ação de alimentos busca preservar o direto à vida e não se trata apenas de interesse privado do alimentante, vez que se refere à matéria de ordem pública, razão pela qual reclama uma eficiente e célere execução.

Desse modo é que a tutela executiva, mormente no que toca aos alimentos, passou a ser considerada como direito fundamental – seguindo a tendência irreversível da constitucionalização do direito de família – havendo, por parte de seus especialistas, constante preocupação em proporcionar a imediata e integral satisfação do direito pleiteado.

Madaleno[5] destaca que:

[...] Especialmente na esfera do direito de família, mostram-se sobremaneira sensíveis as vindicações judiciais que precisam responder às angústias pessoais, tão abaladas pelo influxo do tempo. Procurando sempre conciliar a rápida prestação jurisdicional com a segurança da mais irrestrita defesa, deve o direito aperfeiçoar-se na busca do exato ponto de equilíbrio em que a celeridade processual não prejudique o fundamental direito de poder exaurir os meios de defesa previstos pela lei.

Assim, a execução de alimentos deve prosseguir em seu curso normal, sendo apenas resguardada a meação da embargante, sem qualquer prejuízo para si ou para alimentanda.

Por fim, com relação a garagem, último bem pendente de execução, há de ser observado o disposto no artigo 655–B do CPC[6], incluído pela lei 11.382/2006, devendo a meação da embargante recair sobre o produto da sua alienação.

Há de se ressaltar, porém, que como não há nos autos comprovação do trânsito em julgado da sentença de investigação de paternidade c/c alimentos, o levantamento de qualquer depósito e a prática de atos que importem alienação de propriedade ou ainda, de qualquer ato que possa resultar grave dano ao executado, dependem de caução suficiente a ser prestada pela alimentanda, sobre o saldo do valor previsto no artigo 475-O, §2º, I do CPC[7].

Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os embargos de terceiro opostos por M. A. contra S. S. representada por S. D., para o efeito de excluir a sala de n. 1004, localizada no 10º Pavimento do Edifício Palmares, na Av. Colares Moreira (fls. 116, proc. 0000/2006), bem como metade do valor arrecadado sobre o produto da alienação da garagem de n. 217 (fls. 117), da execução promovida naqueles autos e o faço com fulcro nos artigos 655-B e 1.046 do CPC.

Cientifique-se a exeqüente sobre a impossibilidade da prática de qualquer ato de alienação, sem a prestação da devida caução, conforme já mencionado alhures.

Sem custas.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se

São Luís, 28 de novembro de 2008.


José de Ribamar Castro
Juiz de Direito
1ª Vara de Família
[1] Constituição Federal. Art. 5º. [...].
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
[2] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Lumem Júris: Rio de Janeiro, 2007, p. 484.
[3] - Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Editora Saraiva: São Paulo, p. 426.
[4] Art. 1.052. Quando os embargos versarem sobre todos os bens, determinará o juiz a suspensão do curso do processo principal; versando sobre alguns deles, prosseguirá o processo principal somente quanto aos bens não embargados.
[5] MADALENO, Rolf. Direito de Família em pauta. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

[6] Art. 655-B. Tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem.
[7] Art. 475-O. A execução provisória da sentença far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas: [...]
III – o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais possa resultar grave dano ao executado dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos.
[...]
§ 2o A caução a que se refere o inciso III do caput deste artigo poderá ser dispensada:
I – quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário-mínimo, o exeqüente demonstrar situação de necessidade.

Nenhum comentário: