segunda-feira, 25 de maio de 2009

ENCONTRÃO DA ILHA


O Encontrão da Ilha se constitui de quatro reuniões anuais em que os franciscanos da Ordem Secular – OFS promovem na Ilha de São Luis/MA, em diferentes paróquias para discutirem e refletirem sobre o modo como Francisco de Assis, colocou o Evangelho em sua vida no seguimento do Cristo.

O último encontro foi realizado no Centro Beneficente Nossa Senhora da Glória, localizado no bairro da Alemanha, sob a coordenação da Fraternidade Nossa Senhora dos Anjos e contou com a participação de 109 (cento e nove) franciscanos representantes de Congregação religiosa feminina, frades menores da Primeira Ordem, JUFRA e da Ordem Terceira Secular.

O tema refletido foi sobre - FRANCISCO DE ASSIS E O SACERDÓCIO, com o assessoramento de José de Ribamar Castro.

A PESSOA VELA:

Era uma vez uma pessoa chamada VELA, que, cansada das trevas que lhe circundavam a existência resolveu abrir-se à LUZ. Seu anseio, seu desejo, sua ilusão era: receber a LUZ.

Certo dia, “a LUZ verdadeira que ilumina todo ser humano” chegou com sua presença luminosa e a contagiou. INCENDIOU-A ... E VELA sentiu-se feliz por haver recebido a LUZ que dissipa as trevas e dá segurança aos corações.

De repente deu-se conta de que, o fato de receber a LUZ, não trazia somente alegria, mas também grande exigência. Sim, tomou consciência de que para permanência da LUZ nela,/ deveria ser alimentado a partir do interior, através de um derreter-se diuturno/ e permanente consumir-se...

Então, sua alegria adquiriu nova dimensão, um sentido mais profundo, pois compreendeu que sua vocação era consumir-se ... a serviço da LUZ.

Aceitou em plena consciência a nova vocação. Às vezes, pensava que teria sido mais cômodo, não haver recebido a LUZ, pois em vez de um doloroso derreter-se, sua vida seria um estar ai tranquilamente.

Chegou mesmo à tentação de não mais alimentar a chama, de deixar morrer a LUZ, para não sentir-se tão incômoda.

VELA deu-se conta de que no mundo existem muitas correntes de ar que tentam apagar a LUZ. E, a exigência de haver aceitado a LUZ, a partir do interior uniu ao chamado de defendê-la de certos ventos/ que circulavam pelo mundo...

Mais ainda: sua LUZ permitiu olhar mais facilmente em seu redor e acabou dando-se conta da existência de muitas VELAS apagadas. Umas porque nunca tinham tido a oportunidade de receber a LUZ; outras por medo de derreter-se; e as demais, porque não puderam defender-se do vento.

Então a VELA interrogou-se muito preocupada: poderei em acender outras VELAS? E pensando, pensando, descobriu com profundidade sua nova vocação de – APOSTOLA OU SACERDOTIZA (SACERDOTE) DA LUZ.

Dedicou-se a acender VELAS de todas as características, tamanhos, idades e cores, para que houvesse muita LUZ no mundo.

A cada momento, cresciam-lhe o entusiasmo, a alegria e a esperança, porque no seu derreter dia-a-dia, no seu permanente consumir-se, encontrava por toda parte VELAS velhas, VELAS jovens, VELAS mulheres, VELAS homens, VELAS crianças... e todas acesas!

Ao pressentir que se aproximava o seu fim, porque se havia consumido totalmente ao serviço da LUZ, identificou-se com ELA, gritou com voz forte e com profunda expressão de satisfação no rosto:/ É A FESTA DA LUZ!!!.

Toda essa caminhada da LUZ foi tomada na consciência da entrega total do serviço e do AMOR – era o seu SACERDÓCIO.

II - CANTO

Não esqueçam do amor, dom maior muito além, nos limites humanos do ser Deus em nós, entrega total. Não se nasce sem dor, por amor assumido. Nada resta ao final do caminho da vida, a não o amor.

III – INTERIORIZAÇÃO:

a) O que existe de semelhante ente a pessoa VELA e no nosso Pai São Francisco?

b) Que tipo de VELA em sou?

c) Estou sendo luz ou trevas na minha fraternidade.

IV - FRANCISCO DE ASSIS E O SACERDÓCIO
Trazendo essa reflexão da vela e da luz para o nosso tema, não podemos negar que Francisco de Assis (1182-1226) foi e continua sendo uma das figuras mais testemunhadas historicamente e das mais conhecidas se não das mais populares hoje em dia, e nesse sentido, não foge a condição de ser vela e luz no mundo, seu verdadeiro sacerdócio.

O que se conhece de Francisco, a mais da “oração pela paz” e talvez alguns fragmentos do Cântico do Irmão Sol, não são os escritos que nos deixou, que foram poucos, mas o sacerdócio de Francisco que está na sua figura no seu rosto, no seu exemplo e no seu serviço e estes são os fundamentos constituem os fatos de sua vida curta (44 anos) e a interpretação que dele nos transmitiram.

As hagiografias e as biografias como: duas Vidas de Tomas Celano (1228; 1248); e a escrita, em duas versões, por São Boaventura (1262); os escritos anônimos, de datas incertas, designados com títulos diversos: Anônimo Perusino, Legenda dos Três Companheiros, Legenda de Perusia, denominada também Compilação de Assis, e, por fim, mais tardiamente, o Espelho da Perfeição são abundantes materiais que centralizam a figura de Francisco.

Na perspectiva hagiográfica da Idade Media e segundo uns cânones convencionais, apresenta-se a figura do herói: desenvolvimento de sua vida, suas palavras, suas virtudes, e seus milagres.

Temos que reconhecer, certamente, o impacto enorme que teve a personalidade de Francisco nos seus contemporâneos, sobretudo nos mais próximos, e não podemos duvidar nem minimizar a sólida base histórica dessas memórias.

Mas como todo relato de um testemunho, estas primeiras biografias estão marcadas pelos esquemas culturais e religiosos de quem elaborou pelo meio ambiente e suas expectativas, pelas opções pessoais dos autores, sua compreensão e a interpretação do personagem que apresentam.

O objeto de uma biografia é descrever e, no caso de um santo, glorificar sua figura do herói e propor-lo como exemplo, seus traços humanos e espirituais, suas palavras, o processo de sua vida, tudo isto constitui a mensagem que o escritor quer transmitir aos seus leitores.

Assim a figura identifica-se com a mensagem e se torna palavra e seguimento de vida. Esta figura, em nosso caso, especifica Francisco. A mensagem é um projeto, uma concepção do real, uma visão global homem de Deus, do homem do mundo, uma proposta de um itinerário. Tratando-se da vida crista, se diria: uma espiritualidade ou um sacerdócio.

Podem ocorrer casos em que a mensagem provem de personalidades conhecidas e destacadas, e existir um interesse maior pela mensagem proposta nos escritos que as suas figuras. A exemplo: os escritos de Irineu, de Orígenes, de Agostinho, de João da Cruz, mesmo que não possam ser dissociados de seus autores, não tem respectiva vida e quando esses escritos são estudados, presta-se mais atenção aos seus conteúdos.

Então a pessoa não figura nem é tomada como centro e modelo; sua experiência pessoal serve de ponto de partida e de fundamento a uma doutrina espiritual valida para todos.

O caso de Francisco é particular e lendo as inumeráveis biografias que foram consagradas, como também, os estudos sobre a espiritualidade, fica-se com a impressão de que a mensagem OU O SACERDÓDIO de Francisc constitui sua pessoa e sua vida.

Personalidade de uma grandeza incomparável, Francisco surpreendeu e marcou sua geração e, mediante as narrações que ela transmitiu, aos séculos sucessivos.

São publicadas mais de uma oba por ano, as vezes repetitivas e raramente trazem algo de novo. E uma verdadeira inflação que testemunha, certamente, a fascinação que exerce a figura de Francisco e interpreta-se, segundo o gosto do tempo, o significado de sua figura, e continuam identificando/ figura e mensagem.

Mensagem humilde, pois quem nos oferece apresenta-se como “ignorante e idiota” (Cta.Ordem 39), que, na Idade Média, significa um homem que não cursou estudos literários/ e teológicos próprios da classe clerical.

Sua “formação” teve lugar na vila de Assis, onde havia algo equivalente a uma escola catedrática ou abacial, e onde se aprendia sem duvida mais que decifrar simplesmente um texto. Mas isto não era uma escola superior. Francisco foi dotado de uma inteligência incomum e uma memória particularmente fiel (isto parece evidente a um que esteja familiarizado com seus escritos), mas é claro que não ficou marcado pelas correntes e os procedimentos intelectuais de sue tempo.

Este homem “sem cultura” escreveu e até nos chegaram dois relatos do próprio punho e letra: Louvores a Deus altíssimo e Carta a Frei Leão – ditou suas idéias a secretários mais hábeis que ele.

E surpreendente a importância que ele concede a seus escritos e a ênfase que coloca ao recomendar sua transcrição, conservação, leitura e meditação. Convém “aprender seu teor pelo coração, trazê-los freqüentemente na memória, ensiná-los, aprende-los,/e praticá-los”.

O LUGAR DAS ESCRITURAS

As Escrituras: Antigo e do Novo Testamento forma a tela de fundo dos escritos de Francisco. A simples enumeração da freqüência das citações deixa ver o lugar que ela ocupa neles.

Assim, o sacerdócio de Francisco constituiu a razão de ser de toda sua vida.

FRANCISCO VIVEU O SACERDÓCIO – de forma autentica e sem se esconder no mundo das aparências.

Certamente um dos motivos de desespero (depressão) da pessoa é a busca incessante de parecer ser o máximo o tempo todo.

Nunca se viu em toda a história da humanidade, um culto ao ego tão exacerbado como o de hoje. As pessoas desenvolvem a necessidade de fingir que sabem tudo, mostrando cada vez mais o que não é, fala do que não sabe e exibe o que não tem.

Francisco viveu seu sacerdócio sem ostentação e neste mundo de ostentação, as pessoas se encontram, mas não se relacionam, trabalham mas não se realizam e, principalmente vivem sem conhecer a própria alma. (pessoa não se aceita).

É a tentativa de parecer ser e ter o máximo, acabam vivendo um mundo com o mínimo de paz de espírito/ e de amor.

Isto provoca um vazio muito grande, pois ninguém consegue viver de ilusão (ninguém engana e se mesmo) por muito tempo, porque uma hora a mascara cai.

A acumulação de riqueza e a ostentação estão deturpando os valores das coisas e das pessoas. É um mundo em que o dinheiro é mais valorizado que os sentimento e a aparência mais importante que a essência.

Antes havia uma batalha em que as pessoas queriam ser, hoje, nem ser e nem ter, porque hoje está difícil ter, mas parecer.

Francisco viveu o sacerdócio e não quis ser celebridade, não quis ter e nem aparecer. Francisco foi Francisco. O ser de Francisco foi maior que o ter dos tempos e do aparecer das pessoas.

O ter é aquilo que se agregou a pessoa, sejam bens materiais ou a bagagem cultural, intelectual ou científica desenvolvida, a partir dos valores que acredita positivos para a sua existência. O ter é o que a pessoa não tinha e acredita possuir, como se seu fosse seu.
A sociedade e, por mais que não queiramos estamos nela envolvidos, cobra o ser, o ter e o parecer.

O parecer é o reflexo, a imagem que os outros têm de nós, a partir de juízos de valor falsos ou verdadeiros. É aquilo que pode ser fabricado com “marketing pessoal”.
Algumas pessoas se acreditam ser o que os outros pensam ou dizem delas. Essas pessoas, certamente, ficam à cata do que se chama de validação. A validação é acreditar no que o outro diz para admitir-se ser aquilo. Não pesa, para o validado, a referência própria, aquilo que a sua essência profunda diz, mas o que lhe é soprado ou gritado em seu ouvido/ ou escrito a seu respeito.

Francisco exerceu também Sacerdócio da Paz e para exemplificar este fato temos a passagem do Lobo de Gubio.


No tempo em que São Francisco morava na cidade de Gúbio, no condado do mesmo nome, apareceu um lobo grandíssimo, terrível e feroz, que não somente devorava os animais, senão também os homens; de modo que todos os cidadãos viviam em grande susto, porque muitas vezes se aproximava da cidade; e todos iam armados, quando saíam para os campos, como se fossem para algum combate; e com tudo isso, quem sozinho o encontrava não podia defender-se; e, por medo a este lobo, chegou-se a pontos de ninguém ousar sair da terra.

Pelo que, São Francisco, compadecido dos homens daquela cidade, quis sair ao encontro do lobo, apesar de todos lhe aconselharem o contrário; ele, porém, fazendo o sinal da cruz, saiu cidade, com os seus Companheiros, pondo em Deus toda a confiança.

Anda cá, irmão lobo! Eu te mando, da parte de Cristo, que não faças mal nem a mim nem a pessoa alguma”.

Logo que São Francisco fez o sinal da cruz, aquele lobo terrível fechou a boca, e estacou; e, ao mando do Santo, veio mansamente, como se fosse um cordeirinho, e deitou-se-lhe aos pés. Então São Francisco falou-lhe desta maneira:



“Irmão lobo, tu fazes muitos danos nesta terra e tens cometido grandes crimes, destruindo e matando as criaturas de Deus, sem sua licença. E não somente mataste e devoraste os animais, mas tiveste a audácia de matar e destruir os homens, feitos à imagem de Deus. Por esta razão és digno de forca, como ladrão e homicida péssimo; e toda esta terra é tua inimiga. Mas eu quero, irmão lobo, fazer as pazes entre ti e eles, de maneira que tu não mais os ofenderás, e eles te perdoarão as passadas ofensas, e nem os homens nem cães te perseguirão mais”.

Ditas estas palavras, o lobo, com movimentos do corpo, da cauda e das orelhas, e com inclinações de cabeça, mostrava aceitar o que São Francisco lhe dizia, e querer cumpri-lo. E então São Francisco acrescentou:

“Irmão lobo, visto ser do teu agrado observar esta paz, eu te prometo, da parte dos homens desta terra, atender ao teu sustento, enquanto fores vivo, de sorte que não padeças fome, porque eu sei muito bem que foi ela que te levou a fazer tanto mal. Mas agora, já que eu te concedo esta graça, quero, irmão lobo, que me prometas nunca mais tornar a fazer mal nem a homem nem a animal. Prometes isso?”

E o lobo, com uma inclinação de cabeça, deu evidente sinal de que prometia.

“Irmão lobo, disse mais São Francisco, para que eu me possa fiar de ti, quero que me dês uma prova da tua promessa”.

E estendendo a mão para receber o juramento, levantou o lobo a pata dianteira e familiarmente a colocou na mão de São Francisco, dando-lhe o sinal pedido.
Então acrescentou São Francisco:


“Irmão lobo, eu te mando, em nome de Jesus Cristo, que venhas comigo, sem temor algum, e vamos concluir esta paz, em nome de Deus”.


Feita esta prática, disse São Francisco:

À honra de Cristo. Amém.

“Que maravilha será o dia que cada batizado compreender que sua profissão, seu trabalho, é um trabalho sacerdotal; que, assim como eu celebro a missa no altar cada carpinteiro celebra sua missa na sua carpintaria, cada profissional, cada médico com seu bisturi, a mulher na feira no seu local de trabalho..., estão fazendo um oficio sacerdotal. Quantos motoristas que escutam esta mensagem em seu taxi. Tu, querido motorista, junto ao volante do seu taxi és um sacercedote se trabalho com honradez, consagrando a Deus teu taxi, levando uma mensagem de paz e de amor a teus clientes que vão no seu automóvel.” Em 20/11/1977. D. Oscar Romero – Arcebispo de El Salvador. (Assassinado em 24/03/1980).
São Luis, 24/05/09.

3 comentários:

Waldy Ferreira disse...

Insigne Mestre,

Sinceramente não esperava encontrá-lo aqui. Por uma surpresa do acaso descobri seu blog e, no mesmo instante, tomei liberdade para adicioná-lo na minha lista de blogs favoritos.

Um forte abraço do seu querido discípulo Waldy.

Maurício Gomes Alves disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Maurício Gomes Alves disse...

Prezado Profº. Castro.
Que maravilha de texto. A reflexão se faz impregnada em cada linha e nas entrelinhas a meditação sorri ao leitor.
De modo particular chamou-me atenção a forma como a ideia da VELA foi colocada em todo o texto, dando um enfoque para nossa realidade cotidiana.
Espero que o Senhor continui a brindar-nos, nós internatuas, com tão belos ensinamentos.
Um forte abraço, Maurício.