quarta-feira, 8 de julho de 2009

CONHECIMENTO - CONCEPÇÕES



O conhecimento e a verdade têm sido ao longo do tempo uma inquietação dos pensadores, na busca incessante de satisfazer a curiosidade inata do ser humano quando ao saber do cosmo, do homem e da divindade. É o desvendar o grande mistério da vida. A luta nesse aspecto tem sua característica na dinamicidade existencial e assumem formas diferentes nas circunstancialidades do tempo e espaço, o que leva o filósofo no contato com os seres a uma explicação no tentar compreendê-los.

O conhecimento é um ato de inteligibilidade resultante da relação do sujeito cognoscente com o objeto a ser conhecido, estudado pela Gnosiologia ou Epistemologia, com o sentido teleológico na busca da VERDADE.

Assim, formas possíveis são apresentadas quanto ao conhecimento, a exemplo:

1 – Intuição – admitindo um conhecimento imediato como ponto de partida.

2 – Discursivo – ocorrendo mediante um raciocínio num encadeamento de idéias e juízos organizando a informação para uma conclusão válida.

É, portanto o conhecimento, uma relação permanente entre intuição e razão, a vivência e a teoria, o concreto e o abstrato.

3 – Sensível – construído pela sensação e pela percepção.

4 – Inteligível – é o conhecimento conceitual podendo ser alcançado pelo emprego da razão.

5 – Idealismo – centrado no sujeito saído desde para as coisas.

6 – Realismo – está focado no objeto, sendo a coisa o ponto de partida ao processo do conhecimento.

ESCORÇO HISTÓRICO DO CONHECIMENTO

O pensamento filosófico toma como referência na antiguidade clássica, para uma compreensão didática, o filósofo SÓCRATES. Nesse sentido, divide o saber em períodos denominados de: pré-socrático, socrático e pós-socrático.

No primeiro momento os pensadores pré-socráticos voltavam-se a um conjunto de questionamentos sobre o existes das coisas. Assim, as perguntas que afloravam naquele contexto eram: ”o que é o mundo”?; qual seria a origem da natureza e tudo o que cerca o kosmo?.

Era a filosofia nascente, substituindo as explicações e os determinismos divinos das coisas pela razão humana. Evidencia-se que esses primeiros pensadores não tinham uma preocupação centrada com o conhecimento em si, porque não indagavam se podiam ou não conhecer o SER, mas partiam do pressuposto de que poderíamos conhecê-lo, por sua presença manifesta para os nossos sentidos.

Apenas para ilustração dos argumentos acima citaremos os pensadores:

I – Heráclito – conhecido pela celebra frase não podemos banhar-nos duas vezes no mesmo rio, porque as águas nunca são as mesmas e nós nunca somos os mesmos. Para ele a realidade é uma harmonia dos contrários porque tudo estava em constante mudança. É o devenir ou defluir ou o vir-a-ser das coisas. Com esta linha de raciocínio indica a linha divisória entre o pensamento dos sentidos que nos proporciona a imagem dos objetos e o conhecimento do pensamento que alcança a verdade como a mudança contínua.

II – Parmênides – apresenta uma argumentação contrária a Heráclito. Afirma que só podemos pensar sobre o que permanece sempre idêntico a si mesmo, ou seja, o pensamento não pode pensar sobre as coisas que SÃO e NÃO SÃO, que ora são de um modo e ora de outro modo.

Assim, conhecer seria alcançar o idêntico e o imutável, porque nosso sentido apenas oferece a imagem de um mundo em constante mudança, num fluxo contínuo, no qual nada permanece idêntico em si. Pensar para Parmênides é dizer que um SER é em sua identidade profunda e permanente.

III – Demócrito – sua teoria foi chamada de ATOMISMO, em que a realidade seria construída por pequenas e indivisíveis partículas – os ÁTOMOS. Para ele as coisas têm diferentes feições pela combinação dessas partículas por meio de vários rearranjos. Entretanto, somente o pensamento poderia conhecer os átomos, vez que são invisíveis aos sentidos. Seu argumento apresenta em parte semelhança ao de Heráclito e Parmênides no tocante a distinção entre o conhecimento sensorial e a percepção pelo pensamento, mas, por sua vez, defende a idéias de que a percepção não é ilusória, mas tão somente um efeito da realidade sobre cada pessoa. Conclui que o pensamento sensorial é verdadeiro quanto ao alcançado pelo puro pensamento, embora que aquela verdade seja menos profunda e menos relevante que esta última.

Aqui percebemos duas linhas diferentes de concepções dos seres, a do perceber e a do pensar, temas estes posteriormente tomados como fundantes para os SOFISTAS e SOCRÁTICOS.

Para os sofistas que se viram diante de várias “filosofias”, passaram a defender a idéia de que só podemos ter opiniões subjetivas da realidade e para isto, se fazia necessário que as pessoas fossem portadores de boa oratória, a fim poder então persuadir os ouvintes. A verdade nesse aspecto era uma questão de opinião e de persuasão e a linguagem assumia um papel mais importante que a percepção e o pensamento.

A visão socrática centralizou suas idéias na possibilidade de conhecer e indagar quais as causas das ilusões, dos erros e das mentiras, num esforço para definir as formas entre o conhecimento verdadeiro e a ilusão.

O advento do cristianismo proporcionou rejeitou muito do pensamento antigo, rompendo com várias concepções, passando então, a focalizar o conhecimento e verdade, na fé, vez que as inquietações e questionamentos seriam respondidos por esta, que apresentava soluções para todo e qualquer problema humano.

A modernidade tomou como uma das primeiras tarefas a separação entre fé e razão, por considerá-las distintas e sem qualquer relação entre si no conhecimento, atribuindo a capacidade humana de conhecer pelo entendimento do sujeito.

TEORIA DO CONHECIMENTO

Apresenta a preocupação pela investigação da natureza, fonte e validade do conhecimento. O ponto importante nesta analise é saber o que é o conhecimento e como pode ser alcançado.

CORRENTES DE PENSAMENTOS

A discussão racionalismo-empirismo tem sido uma das mais interessantes e encontra ressonância nos dias atuais, ora pelos seus radicalismos, ora pelas posições intermediárias, as tentativas de conciliação e superação, defendidas pelos pensadores.

1 – EMPIRISMO – o conhecimento tem sua origem ou fundamento na experiência sensorial e válido quando verificado por fatos metodicamente observados.

DIVERGÊNCIAS

1.a – Empirismo Integral – reduz o conhecimento à fonte unicamente empírica como produto de contato direto ou imediato com a experiência. É o sensismo ou sensualismo defendido por Stuart Mill – Sistema de Lógica -, que admite que o conhecimento científico resulta do processo indutivo, sendo este o único método científico.

1.b – Empirismo Moderado ou genético-psicoçógico – a origem temporal do conhecimento parte da experiência, mas não reduz a ela a validade do conhecimento, o qual pode ser não-empiricamente válido. Esta é a defesa apresentada por Lock – Ensaio sobre o Entendimento Humano -, em que explica que a sensação é o ponto de partida para tudo aquilo que se conhece. Assim, as idéias são elaboradas de elementos que os sentidos recebem em contato com a realidade.

2 - RACIONALISMO - assevera o papel preponderante da razão no processo cognoscente, vez que os fatos não são fontes de todos os conhecimentos e não oferecem condições de certeza. Ao lado das verdades de fato existem verdades de razão inerentes ao pensamento humano e dotadas de universalidade e certeza. As verdades de fato são contingentes, particulares e válidas dentro de limites determinados.

2.1 – Racionalismo Ontológico - Leibniz admitindo as verdades de razão e Descartes adepto do inatismo, são considerados representantes do racionalismo ontológico por considerarem o entendimento da realidade como racional e não em racionalizar o real.

2.b – Racionalismo Intelectualista – originado por Aristóteles reconhecendo a existência de verdade de razão e, além disso, atribui à inteligência função positiva no ato de conhecer, atingindo as verdades em face dos fatos particulares que o intelecto coordena, não tem a razão em si, as verdades universais como idéias natas. O intelecto extrai o conceito no real operando sobre as imagens que o real oferece.

Concebe a realidade como algo de racional contendo no particularismo contingentes de seus elementos, as verdade universais que o intelecto “lê” e “extrai”, realizando-se uma adequação plena entre o entendimento e a realidade, no que esta tem de essencial.

2.c – Criticismo – ramificação do racionalismo, considerado por alguns como um estudo autônomo. Consiste no estudo método prévio do ato de conhecer e dos modos de conhecimento. Aceita e recusa certas afirmações do empirismo e do racionalismo. É uma analise critica dos pressupostos do conhecimento.

O maior representante desta concepção e Kant tendo como chancela a determinação do a priori das condições lógicas das ciências. O conhecimento não pode prescindir da experiência, a qual fornece o elemento cognoscível, bem como o conhecimento com base empírica não pode prescindir de elementos da razão, e só adquirem validade universal quando os dados sensoriais são ordenados pela razão.

4 – REALISMO – do latim res. Implica numa preeminência da coisa. É o sujeito em função do objeto.

4.a – Realismo Ingênuo ou pré-filosófico – quando a pessoa aceita a identidade do seu conhecimento com as coisas mencionadas por sua mente sem formular qualquer questionamento sobre o objeto.

4.b – Realismo Tradicional – indaga acerca dos fundamentos das coisas. Há uma preocupação de demonstrar se as teses são ou não verdadeiras, surgindo uma atitude filosófica, na linha aristotélica.

4.c- Realismo Científico – busca verificar seus pressupostos concluindo pela funcionalidade sujeito-objeto, separando os graus conhecíveis do real como a participação, não apenas criadora, do espírito do processo de conhecimento. É conhecer sempre alguma coisa fora de nós, mas em havendo conhecimento de algo não é possível verificar se o objeto, que nossa subjetividade compreende, corresponde ou não ao objeto tal qual é em si mesmo.

5 – IDEALISMO – surgiu com Platão.

5.a - denominado de idealismo transcendente - onde as ideais representam a realidade verdadeira, da qual sairiam às realidades sensíveis, meras cópias imperfeitas, sem validade em si mesmo, mas sim enquanto participam do ser essencial.

5.b – Idealismo Imanentista – as coisas não existem por si mesmo, mas na medida de sua representação ou pensadas, de forma que só se conhece o que está no domínio do nosso espírito e não as coisas como tais. Subordina o conhecimento à representação por entender que a verdade das coisas está menos nela do que em nós, em nossa consciência ou em nossa mente, no fato de serem percebidas ou pensadas.

5.b.1 – Idealismo Psicológico ou conscienciológico – o que se conhece não são as coisas e sim as imagens delas. A realidade é conhecida enquanto se projeta no plano da consciência, revelando como momento de nossa vida interior. A pessoa não conhece as coisas, mas suas representações formadas em nossa consciência em razão das idéias. Hume, Lock e Berkeley.

5.b.2 – Idealismo de natureza Lógica – só conhecemos o que se converte em pensamento, ou é o conteúdo do pensamento. O SER é idéia. Na atitude psicológica, ser é ser percebido na atitude lógica. Ser é ser pensado.

POSSIBILIDADE DO CONHECIMENTO

I – Dogmatismo – afirma a possibilidade de conhecer verdades universais quanto ao ser, à existência e a conduta, transcendendo o campo das puras relações fenomenais e sem limites impostos a priori à razão.

I.a – Dogmatismo Total – afirma à possibilidade de se alcançar a verdade última tanto no plano da especulação quanto no da vida prática ou da ética.

I.b – Dogmatismo Parcial – afirma a possibilidade de se atingir o absoluto em dadas circunstâncias e modos quando não sob certo prisma. A credibilidade no poder da razão ou da intuição como instrumentos de acesso ao real em si.

I.c – Dogmatismo Ético – duvidam da possibilidade de atingir as verdades últimas enquanto sujeito pensante e afirmam as razões primordiais de agir, estabelecendo as bases de sua ética ou de sua moral. Hume. Kant.

I.d – Dogmatismo Teórico – representante Blaise Pascal que não duvidava dos seus cálculos matemáticos e da exatidão das ciências enquanto ciências, mas era levado por uma dúvida no plano do agir ou da conduta humana.

II – CETICISMO – é uma atitude dubitativa ou provisoriedade constante, mesmo acerca de opiniões emitidas no âmbito das relações empíricas. É uma posição de desconfiança em relação às coisas.

II. a – Ceticismo Absoluto – origem grega e também chamado de pirronismo. Prega a necessidade de suspensão do juízo, dado a impossibilidade de qualquer conhecimento certo. Não existe adequação entre o sujeito cognoscente e o objeto conhecido. A pessoa não deve formular problema ante a equivalência final de todas as respostas. Pirron. Augusto Comte.







segunda-feira, 25 de maio de 2009

ENCONTRÃO DA ILHA


O Encontrão da Ilha se constitui de quatro reuniões anuais em que os franciscanos da Ordem Secular – OFS promovem na Ilha de São Luis/MA, em diferentes paróquias para discutirem e refletirem sobre o modo como Francisco de Assis, colocou o Evangelho em sua vida no seguimento do Cristo.

O último encontro foi realizado no Centro Beneficente Nossa Senhora da Glória, localizado no bairro da Alemanha, sob a coordenação da Fraternidade Nossa Senhora dos Anjos e contou com a participação de 109 (cento e nove) franciscanos representantes de Congregação religiosa feminina, frades menores da Primeira Ordem, JUFRA e da Ordem Terceira Secular.

O tema refletido foi sobre - FRANCISCO DE ASSIS E O SACERDÓCIO, com o assessoramento de José de Ribamar Castro.

A PESSOA VELA:

Era uma vez uma pessoa chamada VELA, que, cansada das trevas que lhe circundavam a existência resolveu abrir-se à LUZ. Seu anseio, seu desejo, sua ilusão era: receber a LUZ.

Certo dia, “a LUZ verdadeira que ilumina todo ser humano” chegou com sua presença luminosa e a contagiou. INCENDIOU-A ... E VELA sentiu-se feliz por haver recebido a LUZ que dissipa as trevas e dá segurança aos corações.

De repente deu-se conta de que, o fato de receber a LUZ, não trazia somente alegria, mas também grande exigência. Sim, tomou consciência de que para permanência da LUZ nela,/ deveria ser alimentado a partir do interior, através de um derreter-se diuturno/ e permanente consumir-se...

Então, sua alegria adquiriu nova dimensão, um sentido mais profundo, pois compreendeu que sua vocação era consumir-se ... a serviço da LUZ.

Aceitou em plena consciência a nova vocação. Às vezes, pensava que teria sido mais cômodo, não haver recebido a LUZ, pois em vez de um doloroso derreter-se, sua vida seria um estar ai tranquilamente.

Chegou mesmo à tentação de não mais alimentar a chama, de deixar morrer a LUZ, para não sentir-se tão incômoda.

VELA deu-se conta de que no mundo existem muitas correntes de ar que tentam apagar a LUZ. E, a exigência de haver aceitado a LUZ, a partir do interior uniu ao chamado de defendê-la de certos ventos/ que circulavam pelo mundo...

Mais ainda: sua LUZ permitiu olhar mais facilmente em seu redor e acabou dando-se conta da existência de muitas VELAS apagadas. Umas porque nunca tinham tido a oportunidade de receber a LUZ; outras por medo de derreter-se; e as demais, porque não puderam defender-se do vento.

Então a VELA interrogou-se muito preocupada: poderei em acender outras VELAS? E pensando, pensando, descobriu com profundidade sua nova vocação de – APOSTOLA OU SACERDOTIZA (SACERDOTE) DA LUZ.

Dedicou-se a acender VELAS de todas as características, tamanhos, idades e cores, para que houvesse muita LUZ no mundo.

A cada momento, cresciam-lhe o entusiasmo, a alegria e a esperança, porque no seu derreter dia-a-dia, no seu permanente consumir-se, encontrava por toda parte VELAS velhas, VELAS jovens, VELAS mulheres, VELAS homens, VELAS crianças... e todas acesas!

Ao pressentir que se aproximava o seu fim, porque se havia consumido totalmente ao serviço da LUZ, identificou-se com ELA, gritou com voz forte e com profunda expressão de satisfação no rosto:/ É A FESTA DA LUZ!!!.

Toda essa caminhada da LUZ foi tomada na consciência da entrega total do serviço e do AMOR – era o seu SACERDÓCIO.

II - CANTO

Não esqueçam do amor, dom maior muito além, nos limites humanos do ser Deus em nós, entrega total. Não se nasce sem dor, por amor assumido. Nada resta ao final do caminho da vida, a não o amor.

III – INTERIORIZAÇÃO:

a) O que existe de semelhante ente a pessoa VELA e no nosso Pai São Francisco?

b) Que tipo de VELA em sou?

c) Estou sendo luz ou trevas na minha fraternidade.

IV - FRANCISCO DE ASSIS E O SACERDÓCIO
Trazendo essa reflexão da vela e da luz para o nosso tema, não podemos negar que Francisco de Assis (1182-1226) foi e continua sendo uma das figuras mais testemunhadas historicamente e das mais conhecidas se não das mais populares hoje em dia, e nesse sentido, não foge a condição de ser vela e luz no mundo, seu verdadeiro sacerdócio.

O que se conhece de Francisco, a mais da “oração pela paz” e talvez alguns fragmentos do Cântico do Irmão Sol, não são os escritos que nos deixou, que foram poucos, mas o sacerdócio de Francisco que está na sua figura no seu rosto, no seu exemplo e no seu serviço e estes são os fundamentos constituem os fatos de sua vida curta (44 anos) e a interpretação que dele nos transmitiram.

As hagiografias e as biografias como: duas Vidas de Tomas Celano (1228; 1248); e a escrita, em duas versões, por São Boaventura (1262); os escritos anônimos, de datas incertas, designados com títulos diversos: Anônimo Perusino, Legenda dos Três Companheiros, Legenda de Perusia, denominada também Compilação de Assis, e, por fim, mais tardiamente, o Espelho da Perfeição são abundantes materiais que centralizam a figura de Francisco.

Na perspectiva hagiográfica da Idade Media e segundo uns cânones convencionais, apresenta-se a figura do herói: desenvolvimento de sua vida, suas palavras, suas virtudes, e seus milagres.

Temos que reconhecer, certamente, o impacto enorme que teve a personalidade de Francisco nos seus contemporâneos, sobretudo nos mais próximos, e não podemos duvidar nem minimizar a sólida base histórica dessas memórias.

Mas como todo relato de um testemunho, estas primeiras biografias estão marcadas pelos esquemas culturais e religiosos de quem elaborou pelo meio ambiente e suas expectativas, pelas opções pessoais dos autores, sua compreensão e a interpretação do personagem que apresentam.

O objeto de uma biografia é descrever e, no caso de um santo, glorificar sua figura do herói e propor-lo como exemplo, seus traços humanos e espirituais, suas palavras, o processo de sua vida, tudo isto constitui a mensagem que o escritor quer transmitir aos seus leitores.

Assim a figura identifica-se com a mensagem e se torna palavra e seguimento de vida. Esta figura, em nosso caso, especifica Francisco. A mensagem é um projeto, uma concepção do real, uma visão global homem de Deus, do homem do mundo, uma proposta de um itinerário. Tratando-se da vida crista, se diria: uma espiritualidade ou um sacerdócio.

Podem ocorrer casos em que a mensagem provem de personalidades conhecidas e destacadas, e existir um interesse maior pela mensagem proposta nos escritos que as suas figuras. A exemplo: os escritos de Irineu, de Orígenes, de Agostinho, de João da Cruz, mesmo que não possam ser dissociados de seus autores, não tem respectiva vida e quando esses escritos são estudados, presta-se mais atenção aos seus conteúdos.

Então a pessoa não figura nem é tomada como centro e modelo; sua experiência pessoal serve de ponto de partida e de fundamento a uma doutrina espiritual valida para todos.

O caso de Francisco é particular e lendo as inumeráveis biografias que foram consagradas, como também, os estudos sobre a espiritualidade, fica-se com a impressão de que a mensagem OU O SACERDÓDIO de Francisc constitui sua pessoa e sua vida.

Personalidade de uma grandeza incomparável, Francisco surpreendeu e marcou sua geração e, mediante as narrações que ela transmitiu, aos séculos sucessivos.

São publicadas mais de uma oba por ano, as vezes repetitivas e raramente trazem algo de novo. E uma verdadeira inflação que testemunha, certamente, a fascinação que exerce a figura de Francisco e interpreta-se, segundo o gosto do tempo, o significado de sua figura, e continuam identificando/ figura e mensagem.

Mensagem humilde, pois quem nos oferece apresenta-se como “ignorante e idiota” (Cta.Ordem 39), que, na Idade Média, significa um homem que não cursou estudos literários/ e teológicos próprios da classe clerical.

Sua “formação” teve lugar na vila de Assis, onde havia algo equivalente a uma escola catedrática ou abacial, e onde se aprendia sem duvida mais que decifrar simplesmente um texto. Mas isto não era uma escola superior. Francisco foi dotado de uma inteligência incomum e uma memória particularmente fiel (isto parece evidente a um que esteja familiarizado com seus escritos), mas é claro que não ficou marcado pelas correntes e os procedimentos intelectuais de sue tempo.

Este homem “sem cultura” escreveu e até nos chegaram dois relatos do próprio punho e letra: Louvores a Deus altíssimo e Carta a Frei Leão – ditou suas idéias a secretários mais hábeis que ele.

E surpreendente a importância que ele concede a seus escritos e a ênfase que coloca ao recomendar sua transcrição, conservação, leitura e meditação. Convém “aprender seu teor pelo coração, trazê-los freqüentemente na memória, ensiná-los, aprende-los,/e praticá-los”.

O LUGAR DAS ESCRITURAS

As Escrituras: Antigo e do Novo Testamento forma a tela de fundo dos escritos de Francisco. A simples enumeração da freqüência das citações deixa ver o lugar que ela ocupa neles.

Assim, o sacerdócio de Francisco constituiu a razão de ser de toda sua vida.

FRANCISCO VIVEU O SACERDÓCIO – de forma autentica e sem se esconder no mundo das aparências.

Certamente um dos motivos de desespero (depressão) da pessoa é a busca incessante de parecer ser o máximo o tempo todo.

Nunca se viu em toda a história da humanidade, um culto ao ego tão exacerbado como o de hoje. As pessoas desenvolvem a necessidade de fingir que sabem tudo, mostrando cada vez mais o que não é, fala do que não sabe e exibe o que não tem.

Francisco viveu seu sacerdócio sem ostentação e neste mundo de ostentação, as pessoas se encontram, mas não se relacionam, trabalham mas não se realizam e, principalmente vivem sem conhecer a própria alma. (pessoa não se aceita).

É a tentativa de parecer ser e ter o máximo, acabam vivendo um mundo com o mínimo de paz de espírito/ e de amor.

Isto provoca um vazio muito grande, pois ninguém consegue viver de ilusão (ninguém engana e se mesmo) por muito tempo, porque uma hora a mascara cai.

A acumulação de riqueza e a ostentação estão deturpando os valores das coisas e das pessoas. É um mundo em que o dinheiro é mais valorizado que os sentimento e a aparência mais importante que a essência.

Antes havia uma batalha em que as pessoas queriam ser, hoje, nem ser e nem ter, porque hoje está difícil ter, mas parecer.

Francisco viveu o sacerdócio e não quis ser celebridade, não quis ter e nem aparecer. Francisco foi Francisco. O ser de Francisco foi maior que o ter dos tempos e do aparecer das pessoas.

O ter é aquilo que se agregou a pessoa, sejam bens materiais ou a bagagem cultural, intelectual ou científica desenvolvida, a partir dos valores que acredita positivos para a sua existência. O ter é o que a pessoa não tinha e acredita possuir, como se seu fosse seu.
A sociedade e, por mais que não queiramos estamos nela envolvidos, cobra o ser, o ter e o parecer.

O parecer é o reflexo, a imagem que os outros têm de nós, a partir de juízos de valor falsos ou verdadeiros. É aquilo que pode ser fabricado com “marketing pessoal”.
Algumas pessoas se acreditam ser o que os outros pensam ou dizem delas. Essas pessoas, certamente, ficam à cata do que se chama de validação. A validação é acreditar no que o outro diz para admitir-se ser aquilo. Não pesa, para o validado, a referência própria, aquilo que a sua essência profunda diz, mas o que lhe é soprado ou gritado em seu ouvido/ ou escrito a seu respeito.

Francisco exerceu também Sacerdócio da Paz e para exemplificar este fato temos a passagem do Lobo de Gubio.


No tempo em que São Francisco morava na cidade de Gúbio, no condado do mesmo nome, apareceu um lobo grandíssimo, terrível e feroz, que não somente devorava os animais, senão também os homens; de modo que todos os cidadãos viviam em grande susto, porque muitas vezes se aproximava da cidade; e todos iam armados, quando saíam para os campos, como se fossem para algum combate; e com tudo isso, quem sozinho o encontrava não podia defender-se; e, por medo a este lobo, chegou-se a pontos de ninguém ousar sair da terra.

Pelo que, São Francisco, compadecido dos homens daquela cidade, quis sair ao encontro do lobo, apesar de todos lhe aconselharem o contrário; ele, porém, fazendo o sinal da cruz, saiu cidade, com os seus Companheiros, pondo em Deus toda a confiança.

Anda cá, irmão lobo! Eu te mando, da parte de Cristo, que não faças mal nem a mim nem a pessoa alguma”.

Logo que São Francisco fez o sinal da cruz, aquele lobo terrível fechou a boca, e estacou; e, ao mando do Santo, veio mansamente, como se fosse um cordeirinho, e deitou-se-lhe aos pés. Então São Francisco falou-lhe desta maneira:



“Irmão lobo, tu fazes muitos danos nesta terra e tens cometido grandes crimes, destruindo e matando as criaturas de Deus, sem sua licença. E não somente mataste e devoraste os animais, mas tiveste a audácia de matar e destruir os homens, feitos à imagem de Deus. Por esta razão és digno de forca, como ladrão e homicida péssimo; e toda esta terra é tua inimiga. Mas eu quero, irmão lobo, fazer as pazes entre ti e eles, de maneira que tu não mais os ofenderás, e eles te perdoarão as passadas ofensas, e nem os homens nem cães te perseguirão mais”.

Ditas estas palavras, o lobo, com movimentos do corpo, da cauda e das orelhas, e com inclinações de cabeça, mostrava aceitar o que São Francisco lhe dizia, e querer cumpri-lo. E então São Francisco acrescentou:

“Irmão lobo, visto ser do teu agrado observar esta paz, eu te prometo, da parte dos homens desta terra, atender ao teu sustento, enquanto fores vivo, de sorte que não padeças fome, porque eu sei muito bem que foi ela que te levou a fazer tanto mal. Mas agora, já que eu te concedo esta graça, quero, irmão lobo, que me prometas nunca mais tornar a fazer mal nem a homem nem a animal. Prometes isso?”

E o lobo, com uma inclinação de cabeça, deu evidente sinal de que prometia.

“Irmão lobo, disse mais São Francisco, para que eu me possa fiar de ti, quero que me dês uma prova da tua promessa”.

E estendendo a mão para receber o juramento, levantou o lobo a pata dianteira e familiarmente a colocou na mão de São Francisco, dando-lhe o sinal pedido.
Então acrescentou São Francisco:


“Irmão lobo, eu te mando, em nome de Jesus Cristo, que venhas comigo, sem temor algum, e vamos concluir esta paz, em nome de Deus”.


Feita esta prática, disse São Francisco:

À honra de Cristo. Amém.

“Que maravilha será o dia que cada batizado compreender que sua profissão, seu trabalho, é um trabalho sacerdotal; que, assim como eu celebro a missa no altar cada carpinteiro celebra sua missa na sua carpintaria, cada profissional, cada médico com seu bisturi, a mulher na feira no seu local de trabalho..., estão fazendo um oficio sacerdotal. Quantos motoristas que escutam esta mensagem em seu taxi. Tu, querido motorista, junto ao volante do seu taxi és um sacercedote se trabalho com honradez, consagrando a Deus teu taxi, levando uma mensagem de paz e de amor a teus clientes que vão no seu automóvel.” Em 20/11/1977. D. Oscar Romero – Arcebispo de El Salvador. (Assassinado em 24/03/1980).
São Luis, 24/05/09.

sábado, 4 de abril de 2009

REUNIÃO CULTURAL DA ACADEMIA - APLAC




A Academia Pinheirense de Letras, Artes e Ciências - APLAC, em reunião cultural do dia 03 de abril de 2009, no salão da Academia de Medicina, localizada na sede do Conselho Regional de Medicina, Renascença, apresentou para seus filiados e convidados, palestra sobre o ABORTO.

O acadêmico AYMORÉ de Castro Alvim trabalhou o tema sob a ótica da biologia, enquanto que o acadêmico José de Ribamar CASTRO, fez a abordagem na jurídica.

NA OPORTUNIDADE, A ACADEMIA PARABENIZOU OS ANIVERSARIANTES DO MÊS DE MARÇO, OS ACADÊMICOS JOSÉ MÁRCIO E CASTRO CUJA HOMENAGEM FOI PROFERIDA PELA ACADÊMICA MARITA GONÇALVES, QUE INSPIRADA NOS VERSOS DE ÀGUAS DE MARÇO DE TOM JOBIM E NO POETA MARIO QUINTANA, ELABOROU O TEXTO QUE SEGUE TRANSCRITO IPSI LITERIS:


“ Amigos diletos. Façamos belíssimo silencio. È o poeta menino Mario Quintana que diz:

“A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa”.
Quando se vê, já são seis horas...
Há tempo...
Quando se vê, já é sexta feira...
Quando se vê, já passaram 60 anos”.


Façamos silêncio para ouvirmos as vozes dos nossos próprios corações. Eles batem em uníssono, mas também batem elevados à segunda potência. Iremos homenagear dois acadêmicos, dois confrades, dois amigos, dois irmãos.

O poema de Quintana tudo tem a ver com as duas histórias que me esforçarei para compor em nome da nossa Instituição Cultural.

“Quando se vê, já passaram 60 anos”.

As histórias destas vidas se confundem com todas as narrativas da história da humanidade. Eles, ambos, escolheram caminhos, trilhas ou veredas diferentes, quase opostas, para seguir. Escolheram aquilo que julgaram significativo para suas vidas e para suas famílias. Eles não se aventuraram para desvio. Eles não palmilharam por atalhos. Eles caminharam sempre pela estrada principal: reta, aberta, larga e iluminada.

Falarei de José Márcio Soares Leite e José de Ribamar Castro.

Foi durante a invernada que vieram ao mundo. As chuvas torrenciais que desabem no Maranhão, no terceiro mês do ano, serviram de sonoplastia ante os vagidos dos dois bebês que estavam para nascer.

“É pau, é pedra,
É um caco de vidro, é ávida é o sol
São as águas de março
É o laço, é o anzol”.

E as nuvens inclemente despejavam na ilha de São Luis e na península do Pericumã – em Pinheiro – torrentes, mananciais, cascatas de água que iam...chuviscando...chovendo...chuveirando!...

...E as águas caíam... e a chuva tamborilava canções nos beirais encharcados. Era chuva matinal, chuva vespertina ou noturna...que ensopava tudo.Grossos fios d’água, como brilhantes fios de prata, destabocavam-se das biqueiras dos telhados embalados pelo vento.


“É o vento ventando
É o queira ou não queira
É a chuva chovendo...
É conversa ribeira
Das águas de março
É um fim da canseira”

E foi assim que a notícia se espalhou célere! Maria (em São Luis) e Luzia (em Pinheiro) “descansaram”. Seus bebês nasceram.


“Das águas de março
É o fim da canseira”

Então em nosso calendário ficarão registradas as duas efemérides, 24 e 26, separadas uma da outra apenas por um dia.

Os dois meninos foram crescendo. Ambos têm caracteres físicos ou psicológicos, mais ou menos afins: estatura mediana, morenos, calmos, tímidos, responsáveis, excelentes filhos, pais maravilhosos, chefes de família exemplares, amigos leais.

No olhar de ambos descortinamos um mundo de beleza, sinceridade e verdades. Seus sorrisos inibidos nos falam daqueles que não se expõem por inteiro, que não são apaixonados por palcos e holofotes.Suas ações sempre corretas, são realizadas nos “bastidores”, onde nunca se submetem à exposição das platéias.

Daí o charme que possuem, talvez até mesmo sem nunca terem se apercebido disto.


Eles são como dois pássaros, vivem na terra com suas famílias... mas profissionalmente...voam alto...vão perto das nuvens. São chafariz, córregos, alimentos, força e exemplo para os filhos e mulheres.


“É uma ave no céu
É um ave no chão
É um regato é uma fonte
É um pedaço de pão”.


Dia 24 de março.


José Márcio, filho de Maria fez aniversário neste dia. Ele tem um pai de primeira grandeza. Um DOUTOR que mesmo sem doutorado e com graduação em Ciências Jurídicas, tinha a envergadura de um monstro sagrado do saber e da cultura; devorava tratados, compêndios e enciclopédias! Mais que isto, possuía uma memória privilegiada e o dom magnífico da oratória. Fluente, culto, voz e gesto acompanhavam o borbotar das idéias que jorravam da sua cabeça privilegiada. Com um linguajar castiço era um mestre a encantar aqueles que o escutavam como se fora aplicados discípulos.


Dia 26 de março.


José de Ribamar Castro,nosso outro homenageados, filho de Luzia, era também filho de um DOUTOR.

Já repararam a coincidência?.

Este Doutor de que falo agora, também como o primeiro, não cursou nenhum doutorado, se quer graduou-se em uma Universidade de Letras ou Ciências. Este Doutor diplomou-se nas esquinas da vida, formou-se através das tradições populares da Moral e dos Bons Costumes passados de pais para filhos oralmente e apreendido nos joelhos das mães e na sabedora das avós do século passado.Estudou trabalhando nos Postos de Saúde e dos Hospitais de Pinheiro. Foi PHD em dedicação profissional, cooperação, ajuda, disponibilidade, indulgência, calor humano, bondade, caridade cristã, amor ao próximo.

Prestava seus serviços de enfermagem atendendo nos postos de saúde, nas maternidades, nas cadeias, nos prostíbulos, nas residências dos figurões do comércio da cidade, nos casebres da periferia e das “beiradas” de Pinheiro. Era solicitado a qualquer hora do dia ou da noite em que precisassem de sua ajuda. Comparecia com o seu modo simples, respeitador, educado, atencioso, nobre naquilo que fazia, aplicava injeções, efetuava curativos, socorria acidentados. Andava a pé, de ponta à ponta da cidade deixando transparecer toda a bondade de seu trabalho e de sua beleza interior. Ele também era um homem um homem bonito. Delgado, elegante, tinha os cabelos cor de mel. Carregava nos ombros o peso da responsabilidade mal remunerada. Em casa a mulher e os filhos viviam do parco tilintar das moedas do salário pequeno. Ínfimo para tão incomensurável trabalho de assistência humana.

“É o fundo do poço
É o fim do caminho
No rosto o desgosto
É um pouco sozinho...”

Falemos agora dos dois meninos.

Na infância, nos campos da cidade, pisotearam o balsedo desejando misturar-se ou alcançar as japieçocas e jaçanãs coloridas que davam seus razantes acima de suas cabecinhas.


“É pérola do campo
È o nó da madeira
Passarinho na não
Pedra de (atiradeira) baladeira”.

Empinavam papagaios nas ruas e praças. Subiram em árvores nos quintais cobertos de fruteiras. Banharam-se nas chuvas; folguedos estes próprios das crianças daquela época. Foi ali naquela cidadezinha pacata e aconchegante que aprenderam as primeiras letras, que escutaram falar de Deus, na matriz de Sto Inácio, onde assistiram às primeiras missas. Ambos foram meninos quietos,educados, estudiosos e dóceis. Ao há uma só historinha que registre uma travessura maior, uma desobediência, uma contrariedade causada por Márcio e Ribamar.

Mal saídos da infância, ou ainda em criança, foram obrigados a uma radical mudança de vida.

Márcio que desde o primeiro ano de vida foi criado pela bondosa Juli-tia-avó do menino – fora “requisitado” pelo pai.Teria que deixar o paraíso onde morava, voltar para a casa paterna e conviver com os outros cinco irmãos. Foi um choque! Mas...crianças não tinham querer!. Só deveres!.

Ribamar sofrendo ao meu ver todo o sacrifício dos pais, encontrou na religião a solução para seus problemas. Partindo da casa paterna – um trajeto diferente do outro – foi para a capital, entraria no Seminário. Como religioso ajudaria toda a família. Ajudaria na educação dos irmãos.

Passados 60 anos.. as coisas foram se encaixando de formas diferentes. Porém ambos foram fiéis à educação e princípios morais que receberam e ao conceito de personalidade e caráter que introjetaram. Construíram sólidas famílias. Tornaram-se Mestres.

Márcio é médico – dedicou-se ao bem estar físico e psicológico do homem. Apaixonou-se pela Saúde Pública onde fincou suas raízes. Viajou pelos mais inóspitos rincões do Estado para implantar os Programas Sociais de Saúde que seu Ministério exigia. Passou rios... passou pontes...

“É um passo é uma ponte
É um corpo na cama
É o carro enguiçado
È a lama...é a lama...”

Ribamar é juiz – Milita na 1ª Vara da Família de onde correm as boas notícias da presteza, da educação, da bondade, do carinho e da competência daquele juiz especial. Despacha em tempo recorde os processos que caem em suas mãos. È um devotado senhor da Justiça e do Direito.

“É João é José
È um belo horizonte
È um espinho na mão
È um corte no pé”.

Na família de Márcio, a não ser ele, todos os demais: esposa, filhos e genros, são advogados. Estudioso e inteligente dedica todas as suas horas vagas ao estudo do Direito. Comenta-se na família que seria ótimo que todo advogado soubesse Direito como Márcio - José Márcio.

Em contrapartida, a família inteira de Castro, incentivada pela bondade e responsabilidade humanitária do pai, fundou uma Instituição Social de ajuda às pessoas menos favorecidas. É uma espécie de asilo, ampara pessoas idosas. É uma espécie de Escola – educa crianças dando-lhes lazer e alimento. É uma espécie de Hospital. Mantém uma equipe médica que atendem os que precisam. È uma espécie de Academia – faz fisioterapia. È uma espécie de Clube. Dá lazer, alegria e felicidade. O que aconteceu? Tornaram-se todos, Médicos das Almas, como São Lucas.

Todos nós aqui presente sabemos daquela história: “lobo em pele de cordeiro!” Com nossos homenageados deu-se algo parecido:

José Márcio às vezes é “O Médico em pele de Advogado” e o José de Ribamar é “ O Advogado em pele de Médico”.

“Quando se vê, já passaram 60 anos”.

Depois das duas histórias que lhes contei queria dar-lhes uma explicação. Para os dois trouxemos livros de lembranças.

Um deles receberá um livro que relata um “Roteiro Histórico Lírico e Sentimental” como sua vida. É o de José Márcio. O outro são “Memórias de uma família que aprendeu a criar finais felizes”. É o livro que escolhemos para Ribamar.

Brindemos pois aos nossos companheiros: ao Márcio – o Médico- Advogado e ao Castro o Juiz-Médico! Brindemos aos sexagenários mais GAROTOS que conhecemos...

“È pau...é pedra
È o fim do caminho
É um sapo é um rã
É um resto de mato, na luz da manhã
São águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração”.

Obrigado.

segunda-feira, 2 de março de 2009

NULIDADE DE CASAMENTO - BIGAMIA

Processo n.º 0000/2007
Requerente: P. S.
Requerida: H. L. C.
Ação de Divórcio

Vistos etc.

Cuida-se de Ação de Divórcio, promovida por P. S., através de advogado constituído, contra H. L. C., devidamente qualificados nos autos.
Aduz o requerente que contraiu núpcias com a requerida em 06 de novembro de 1971, em regime de comunhão parcial de bens, união da qual advieram três filhos, todos maiores e capazes.

Alega que se encontram separados de fato por mais de 12(doze anos). Relata que possuem um único bem a partilhar e os bens móveis já foram partilhados segundo interesse de cada um.

Relata que não necessita de alimentos, haja vista possuir condições mínimas para seu sustento. Por fim, alega que não há possibilidade de reconciliação, razão pela qual requer a decretação do divórcio do casal.

Em contestação de fls.24/53, a requerida levantou uma questão de ordem pública, afirmando que o autor é bígamo, tendo o mesmo contraído casamento com F. A. em 27 de janeiro de 1951 na cidade de São João Batista, para comprovação do alegado juntou documento de fls.28.
Audiência de Instrução e Julgamento, às fls. 60/62, na qual foi realizada a oitiva das testemunhas.

Em sede de audiência manifestou-se o Ministério Público em fls.52/53.
Os autos vieram conclusos para deliberação.

Eis o relatório. Decido.

Compulsando os autos, verifica-se que há uma questão de ordem pública a ser analisada.

A requerida em sua contestação trouxe aos autos uma nova situação jurídica, a de que o requerente é bígamo, posto que contraiu casamento duas vezes, primeiro com F. A. em 27 de janeiro de 1951 na cidade de São João Batista e depois com a requerida em 1960.

Informação esta que foi confessada pelo autor em seu depoimento ao afirmar “que nunca se divorciou de F. A., mas que ocorreu a separação de fato desde 1954; que não encontrou documentos do primeiro casamento na Comarca de São João Batista em razão do Livro de Registro não haver sido encontrado”. (fls.61)

No caso em baila, não resta dúvidas que o segundo casamento contraído com H. L. C., é eivado de nulidade por ter sido contraído em franca desobediência aos impedimentos do casamento que determina o art 1.548 do CC[1].



Trata-se uma norma proibitiva, dirimente, aonde não há exceções, senão vejamos:

Art. 1.521. Não podem casar:
(...)
VI - as pessoas casadas;
(...)

O casamento que se realiza emanado de infração de impedimento imposto pela ordem pública, em virtude de sua ameaça à estrutura da sociedade ou pelo fato de ferir os princípios básicos em que ela se assenta, será nulo.

Entretanto é necessário analisar as condutas das partes em separado, a fim de se especificar os efeitos jurídicos decorrente dessa relação.

P. S.

É fato incontroverso, que o autor é bígamo, tendo contraído, casamento duas vezes, primeiramente com F. A. em janeiro de 1951 na Comarca de São João Batista (fls.28) e a posteriori com H. L. C. em 1960(fls.06).

Dessa forma não parece razoável cogitar a possibilidade de que o mesmo tenha agido com boa-fé, posto, ser senso comum no nosso país, independente do nível social e intelectual, que não se pode casar mais de uma vez, trata-se de uma máxima, semelhante “o de que matar é crime”.




Muito menos é plausível a possibilidade de que o autor da presente ação tenha se “esquecido “do seu matrimônio anterior, face que até os dias atuais, em seu depoimento, teceu comentário a seu respeito.

Logo, pode-se afirmar que o supracitado, não agiu de boa- fé ao casar-se com H. L. C., devendo portanto ser seu segundo casamento declarado nulo com efeitos ex-tunc, ou seja, retroativos)

H. L. C.


No que se refere à cônjuge, H. L. C., não há provas de a mesma tinha conhecimento do impedimento do Pedro dos Santos.

A boa-fé dos nubentes é presumida até prova em contrário, ou seja, é uma presunção relativa sendo de competência daquele que a nega, o ônus da prova.

Boa-fé, no caso, significa ignorância da existência de impedimentos dirimentes à união conjugal, devendo-se apurar a sua existência na celebração de casamento, sendo irrelevante eventual conhecimento da causa de invalidade posterior a ela.

No caso em concreto, não foi suscitado a má-fé da demandada quer seja pelo autor, quer seja pelo Ministério Público, de tal maneira que não pode este juízo afirmar que tinha a mesma conhecimento do matrimônio anterior.




Embora o erro de direito seja inescusável, em geral, por força do art. 3º da Lei de Introdução do Código Civil[2], pode ser invocado para justificar a boa-fé, sem que com isso se pretenda o descumprimento da lei, pois o casamento será de qualquer forma declarado nulo.

A nulidade absoluta é aquela que apresenta algum vício essencial acarretando a total ineficácia do negócio jurídico, como prevê o artigo 166 do novo Código Civil[3].

A lei, através de uma ficção e tendo em vista a boa-fé dos contraentes ou de um deles, atribui ao casamento anulável ou mesmo nulo os efeitos do casamento válido, até a data da sentença que o invalidou. Vê-se que o legislador manifestou, ao criar este instituto, o propósito de proteger os cônjuges de boa-fé e, principalmente, a sua prole.

Desta forma, o casamento putativo é aquele realizado na completa ignorância de um ou ambos os cônjuges sobre determinado fato ou circunstância que, por determinação legal, ou por tornar insuportável a vida em comum, o torne nulo ou anulável.

Casamento putativo é aquele em que os cônjuges acreditam, julgam, pensam estar casados legalmente, mas, na realidade não estão. Há neste casamento um vício que o tornará anulável ou nulo.


Etimologicamente, a palavra “Putativo” provém do verbo latino putare, que significa imaginar, presumir ser, e assim “Putativo” (do latim putativus) significa imaginário, fictício, irreal[4].

Neste particular, confiram-se as lições de PONTES DE MIRANDA [5]:
"A declaração de putatividade não é pretensão do cônjuge de boa-fé contra o outro cônjuge, nem é a ação daquele contra esse: primeiro, porque os dois podem ter estado de boa-fé e, em conseqüência disso, ser putativo, em relação a ambos, o casamento. A pretensão é ligada à instituição mesma do casamento, no que sobrevive a excepcionalidade da concessão, presa, nos casos esporádicos do direito romano, a regras de caráter individual, emanadas do Príncipe e, como teoria, às razões de ordem consciencial e de eqüidade, que pesaram no direito canônico. Titulares da pretensão e da ação são os cônjuges, ou o cônjuge, ou o defensor do matrimônio, que é parte, contra a entidade de que emana a tutela jurídica, o Estado. A pretensão de direito de família é absoluta."

E ainda prossegue:

"Tratando-se da putatividade para efeitos civis, é o estado o sujeito passivo da pretensão à declaração.

Daí decorre que, em qualquer tempo da causa de decretação da nulidade ou da anulação, é permitido levantar-se a questão da putatividade, não sendo de afastar-se a ação do cônjuge, ainda depois de proferida sentença de nulidade ou de anulação, se não foi por ele promovida a ação respectiva, nem houve aquiescência à causa (eg., confissão), para que se declare o caráter putativo do casamento. Ressalta o elemento institucional, que não se pode apagar, por certo, em matéria de casamento."

Outrossim, ainda que a requerida tenham agido de boa fé, a lei civil proíbe o casamento de pessoas que já são casadas, não podendo prevalecer o ato praticado, por eivado de nulidade absoluta.

Revela-se inequívoca a necessidade da decretação do casamento celebrado entre as partes, em 11 de dezembro de 1960 (fls. 06).

Os efeitos, em relação aos cônjuges, variam conforme estejam ambos ou um só deles de boa-fé, posto que o parágrafo 1º do artigo 1.561 dispõe que “se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os efeitos civis só à ele e aos filhos aproveitarão” .
Dessa forma, a sentença anulatória retroage à data do casamento, tendo efeito ex-nunc, dando eficácia como se fosse válido, até a data da sentença que declarou a nulidade ou anulabilidade matrimonial, benefício somente aproveitado pelo cônjuge de boa-fé.





DO CARÁTER REAL DA RELAÇÃO

Não obstante o casamento contraído pelas partes, seja nulo, é notório que houve um relacionamento entre os mesmos, estando presente todos os requisitos necessários para configuração da União Estável, mormente no que se refere à residência comum, convivência duradoura, pública, notória.

Constata-se também que não há nenhum impedimento legal, visto que o Código Civil é peremptório ao proibir a caracterização da União Estável quando houver impedimento matrimonial entre companheiros, salvo na hipótese de a pessoa que estiver casada se achar separada de fato ou judicialmente.[6]

Assim, restou comprovado que os requisitos da convivência e da unicidade de vínculos foram atendidos, posto que durante o casamento existente entre P. S. e F. A. há a incidência de separação de fato, de modo que se torna imperioso o reconhecimento da união estável entre Pedro dos Santos e H. L. C.

No que toca ao imóvel litigioso, há de se tecer breves considerações.



Em primeiro lugar, destaca-se que de acordo com o art. 2.035 do CC/2002:

"A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece o disposto em leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinadas forma de execução."

Em comentários ao artigo, Maria Helena Diniz afirma que "os atos e negócios jurídicos que se constituíram antes da entrada em vigor deste Código obedecerão às normas referidas no art. 2.045, tendo-se em vista que o novo diploma legal ainda não irradiou quaisquer efeitos".
Como efeito de tal disposição legal, aplica-se à divisão dos bens de União Estável constituída e caracterizada antes do advento da novel Codificação a norma que a precedia, qual seja, a Lei n. 9.278/96, que em seu art. 5º dispõe:
"Art. 5º Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito.

Considerando as provas apresentadas nos autos e com base principalmente no depoimento das partes concluímos que o único ponto o qual se encontra controvertido está relacionado com a forma de divisão do único bem do casal, imóvel localizado à AV 12, 14, do conjunto habitacional Anil III.
O supracitado imóvel foi adquirido em 1970, portanto já no curso da relação da união estável do casal, que se iniciou em 1960.

Dessa forma este juízo tem o entendimento que o imóvel referido, forma o patrimônio do casal, e, portanto deverá ser dividido, a fim de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes[7]

O M. Público compartilha do mesmo entendimento:

“MM. Juiz ante a prova de casamento anterior do requerente e a ausência de divórcio decretada nessa união e tendo P. S. e H. L. C. constituído verdadeira união estável por longos anos, período no qual criaram os filhos e adquiriram um único bem partilhável, esta Promotoria de Justiça se manifesta seja declarado nulo o casamento de ambos nos termos do art. 166 inciso II do CC e reconhecida e dissolvida a união estével de ambos, quanto são pedido de separação

de corpos formulado pelo advogado do autor, considerando relevante os seus fundamentos e sendo recente o retorno da senhora H. L. C. para a casa da família, este órgão Ministerial se manifesta favoravelmente ao deferimento da medida de forma que seja a senhora H. L. C. compelida a deixar a residência até a venda do imóvel e sua partilha de forma igual entre os litigantes. Presente parecer foi formulado nos termos do art. 1723 do CC e do art. 888, inciso VI do CPC.

Ademais, conforme se depreende dos autos, pode-se afirmar que há uma intranqüilidade na morada do casal em tela, inclusive com a possibilidade de ocorrência de agressões físicas, posto ter a requerida após treze anos da separação do casal ter voltado para a residência ocupada pelo requerente e sua nova companheira que convive há mais de três anos.

Tal fato é merecedor de urgente observação do Juízo tendo em vista que a relação entre os três debaixo do mesmo teto é insustentável, inclusive com risco de uma iminente tragédia, situação em que é perfeitamente cabível a intervenção jurisdicional para tutelar a segurança das pessoas envolvidas.

Do exposto, de acordo com o parecer ministerial julgo improcedente o pedido para decretar o divórcio de P. S., e H. L. C., por estarem ausentes os requisitos de um casamento válido, pela infrigência do art. 1.521, inciso VI do CC.


Dessa maneira, declaro a nulidade do casamento realizado entre P. S. e H. L. C., com efeitos ex- tunc para ele, retroativo até a data da celebração e para ela com efeitos ex-nunc, retroativos até a data do trânsito em julgado desta sentença.

Em contrapartida, declaro e desconstituo a união estável existente entre P. S. e H. L. C. e o faço nos termos do artigo 1.723 do Código Civil, artigo 226, §3º da Constituição Federal e artigo 5º da Lei 9478/96, devendo para tanto e pelas razões expostas a imóvel localizado à Avenida X, nº XY, do conjunto habitacional Anil III, ser dividido entre os conviventes, igualmente, no prazo máximo de 06(seis) meses, devendo nesse ínterim a requerida desocupar o imóvel.
Expeça-se o competente Mandado.

Sem custas, face ao pedido de assistência judiciária, que ora defiro.
Após o trânsito em julgado, arquive-se com as anotações de praxe.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

São Luís, 02 de março de 2009.

José de Ribamar Castro
Juiz de Direito
1ª Vara de Família

] Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:
I - pelo enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil;
II - por infringência de impedimento.
[2] Art., 3º Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.
[3] Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
[4] 27 FUGITA, Jorge Shiguemitsu, Curso de Direito Civil, Direito de Família,p. 153.
[5] PONTES DE MIRANDA. Tratado de Direito de Família. Vol 1."

[6] Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente..

[7] Art. 884. do CC: Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

INTEMPESTIVIDADE DA APELAÇÃO

Processo n. 0000/2006

Vistos etc.


Cuida-se de ação de oferecimento de alimentos proposta por F. A. J., em favor de sua filha R. D., representada por C. M., devidamente qualificados nos autos.

Processo sentenciado às fls. 57/61.

Inconformado com o decisum, o requerido interpôs recurso de apelação, no dia 19/02/2009, conforme consta às fls. 64/67.

É o relatório.

Com o presente recurso, almeja o apelante a reforma da sentença que fixou os alimentos a que deve prestar à sua filha R. D. em 15%(quinze por cento) o que, segundo o apelante, foi fixado em patamar superior ao que havia ofertado, qual seja , 7,5 %(sete e meio por cento) pelo que requer o provimento do apelo para reformar a mencionada sentença.

Ocorre que, para que referido recurso produza o efeito de devolver ao órgão ad quem o exame da matéria impugnada é imprescindível que estejam preenchidos certos pressupostos de admissibilidade.

Depreende-se dos autos que não foi observado um dos pressupostos objetivos, qual seja: a tempestividade. O presente recurso fora interposto a destempo e, por isso, a via recursal sob análise sequer merece ser conhecida. Senão vejamos.

É cediço que, por determinação legal, o prazo de interposição do recurso de apelação é de 15 dias[1], cujo início conta-se a partir data da intimação das partes sobre o teor da sentença, tal como observado no artigo 506 c/c 242 do CPC[2].

Verificou-se que as partes foram intimadas, via Diário de Justiça (à fl. 62), em 30/01/2009, tendo, portanto, até o dia 16/02/2009, para interposição do mencionado recurso, o que não se verificou no caso em tela.

Note-se que a petição do apelante data de 19/02/2009, portanto 03(três) dia após o lapso previsto em lei.

Importante ressaltar, por oportuno, que tal prazo é peremptório, ou seja, não admite prorrogação por acordo entre as partes ou por determinação do Juízo, além de que, constatou-se não haver qualquer causa superveniente que obstaculizasse o andamento normal do prazo, exceção prevista no artigo 507 do CPC[3].

Cumpre destacar ainda que, nessa espécie de recurso, possui o magistrado a possibilidade de avaliação dos requisitos de admissibilidade em duas oportunidades, a saber: no recebimento da apelação e, posteriormente, depois do oferecimento das contra-razões (artigo 518, §1º CPC)[4].

Assim, a avaliação dos requisitos de admissibilidade, oportunamente, é medida prevista por lei, devendo ser imposta também ao caso em tela.

Pelo exposto, ante a manifesta intempestividade, não conheço do presente apelo interposto por F. J. contra sentença proferida às fls. 57/61 e o faço em consonância com os artigos 506, II c/c 508 do CPC.

Intimem-se. Notifique-se o representante do Ministério Público.

São Luís, 27 de fevereiro de 2009.


José de Ribamar Castro
Juiz de Direito
1ª Vara de Família

[1] Art. 508. Na apelação, nos embargos infringentes, no recurso ordinário, no recurso ordinário, no recurso extraordinário e nos embargos de divergência, o prazo para interpor e para responder é de 15 dias.
[2] Art. 506. O prazo para interposição do recurso aplicável em todos os casos o disposto no art. 184 e seus parágrafos, contar-se-á da data:
II – da intimação das partes quando a sentença não for proferida em audiência.
Art. 242. O prazo para a interposição de recurso conta-se da data, em que os advogados são intimados da decisão, da sentença ou do acórdão.
[3] Art. 507. Se, durante o prazo para a interposição do recurso, sobrevier o falecimento da parte ou de seu advogado, ou ocorrer motivo de força maior, que suspenda o curso do processo, será tal prazo restituído em proveito da parte, do herdeiro ou do sucessor, contra quem começará a correr novamente depois da intimação.
[4] Art. 518. Interposta a apelação, o juiz, declarando os efeitos em que a recebe, mandará dar vista ao apelado para responder.
§ 2o Apresentada a resposta, é facultado ao juiz, em cinco dias, o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

PERDA DO PODER FAMILIAR

Processo n.º 00009/2007
Requerente: A. M.
Requerida: N. S.
Ação de investigação de paternidade

Vistos etc.

Cuida-se de ação de investigação de paternidade, promovida por A. M. contra N. S., com o fito de ver reconhecida a paternidade de G.M., menor de idade, todos devidamente qualificados nos autos.
Aduz o requerente que manteve relacionamento amoroso com a requerida durante quatro anos e que dessa união resultou o nascimento da menor em questão. Afirma que permaneceu com a requerida por apenas 01 (um) ano após o nascimento da filha, mas que nunca teria faltado com os deveres de pai.

Relata, porém, que a requerida entregou a criança a T.J. L., que a registrou posteriormente com o nome de I. D. J. L., situação que discorda, uma vez que pretende, como presente feito, ver declarada sua paternidade.
A inicial veio instruída com os documentos de fls. 08/14.

Audiência de conciliação à fl. 147, na qual se verificou a ausência da requerida, apesar de devidamente citada e intimada. Foi promovida também a citação e intimação de T.J. L. (fl.39), mas esta não se manifestou, conforme consta dos autos.

Transcorrido in albis o prazo para contestação (fls. 51) foi declarada a revelia das requeridas e designada audiência de instrução e julgamento.
Às fls. 54/58 há a contestação intempestiva de N. S., na qual pede sua exclusão do feito por ilegitimidade passiva, o que justifica sob o argumento de que a menor está atualmente registrada em nome de T. J. L.
Através de fls. 70/72, há comprovação de que a menor foi registrada, posteriormente, em nome do requerente.

Audiência de Instrução e Julgamento às fls. 76/77, na qual foram tomados os depoimentos das partes, bem como inquiridas as testemunhas arroladas. Na ocasião, ficou estabelecido que a guarda da menor permanecesse com T.J.L., bem como foi deliberada apuração quanto à vida pregressa do requerente.

A representante ministerial pugnou pela realização de diligências (fls. 79), o que foi deferido e cumprido às fls. 97 (ofício comunicando a existência de feitos criminais contra o requerente) e às fls. 111/123 (Laudo da Divisão de Serviço Social e Psicologia do Fórum)

Instada a se manifestar, a representante do Ministério Público, em parecer de fls. 180/183, opinou pela realização do exame de DNA.
Estando o feito devidamente instruído, bem como evidenciado que os fatos alegados pela parte autora são incontroversos, quais sejam, a paternidade da menor em questão, entende este Juízo pela desnecessidade de realização de exame de DNA e imediato julgamento do feito, inteligência dos artigos 329 e 269, II do CPC[1].

É o relatório. Decido.

Da preliminar de ilegitimidade passiva

A requerida alega, por ocasião da contestação, que a ação não deveria ter sido intentada contra si, uma vez que a menor não estaria registrada em seu nome.

Ocorre que, além da requerida ter contestado fora do prazo legal, apesar de concedido prazo em dobro à Defensoria Pública, a presente preliminar não merece prosperar.

Só a título de esclarecimento, a requerida é mãe biológica da menor e, apesar de constar registro feito em nome de T. J.L., há também um segundo registro no qual consta a requerida e o requerente como pais da menor, razão pela qual a mãe biológica também deve ser sujeito passivo da lide, pelo que rejeito a preliminar suscitada.

Do mérito

Em análise dos presentes autos, se observa, claramente, que a questão principal do feito não gira em torno da paternidade do requerido, muito embora esta se constitua como sendo o único pedido constante dos autos.

Como se vê, a paternidade há muito restou evidenciada neste feito, pois o autor logrou êxito em comprovar, desde o início, ser o pai biológico da menor em questão, consoante se vê pelos documentos acostados às fls. 70/72 e 76 que comprovam de forma inequívoca os fatos alegados.
Outrossim, em nenhum momento, tal fato foi negado pelas requeridas, que reconhecem a paternidade, mas alertam apenas quanto à violência e agressividade do requerido. Em sede de contestação, N. S., mãe biológica da criança, afirma que:

[...] Os litigantes de fato conviveram juntos por aproximadamente quatro anos [...] que no último ano do relacionamento nasceu a menor I.D.J.L, que ficou na companhia de ambos os pais por cerca de oito meses. (fl. 55).

[...] que é mãe da menor objeto da presente lide; que o requerente é o pai da menor. (fl. 76).

Tal fato também foi corroborado por testemunhas em juízo, senão veja-se:
[...] que conhece o requerente desde 2000, e conheceu a requerida morando com o requerente como concubina dele; que o requerente teve uma filha com a requerida. (Testemunha I. R. S., fl. 77).

Assim, levando em consideração que a posição da lei processual civil admite como instrumento hábil ao alcance da verdade não somente a prova técnica (DNA), mas todas as admitidas em Direito (orais, documentais e indiciárias), forçoso é o reconhecimento da paternidade alegada, principalmente quando tal fato sequer foi motivo de controvérsia.

Portanto, a questão principal - se não é a paternidade do requerido - pode perfeitamente ser vislumbrada como sendo sobre qual família a menor deve ser colocada, diante do reconhecimento da paternidade biológica.

Quanto a este aspecto, o processo é rico em detalhes e a análise de cada entidade familiar é fundamental.

A família atual da menor é composta pela “mãe adotiva” e por seu companheiro, os quais foram objetos de minuciosa análise pela Divisão de Serviço Social e Psicologia do Fórum (fls. 111/123).

Verificou-se que ambos, que não possuem filhos, acolheram a menor há mais de 06 (seis) anos, como se filha fosse, promovendo-lhe assistência material, afetiva, moral e educacional, dentro de um ambiente propício ao desenvolvimento físico e mental de uma criança.
Eis os excertos do Laudo que merecem destaque:

[...] Com relação aos pais adotivos, [...] demonstraram serem pessoas equilibradas e responsáveis, evidenciando a grande afetividade pela menor, além da proteção e segurança que almejam para que esta tenha um desenvolvimento psicossocial saudável. (fls. 123).

[...] Em visita realizada no domicílio da mãe adotiva da menor, [...] contatamos com a vizinha, Senhora R. L. S., que nos informou que [...] D. T.J.L. e seu companheiro, senhor. F., tem uma grande dedicação e amor pela criança, trata e cuida como se fosse uma filha biológica[...](fls. 116).

[...] visualizamos que a casa da Senhora. T.J.L é localizada em terreno amplo [...] com boas condições de moradia e comodidade. A área da moradia é estilo sítio, área arborizada, conservada e limpa.

[...] posteriormente, entrevistamos Senhora T.J.L., esta nos relatou que cria a menor desde 01 ano e seis meses, quando lhe foi dada pela mãe biológica, Senhora N. s., [...] que pretende ficar com a mesma, [...] que gostaria mesmo de adotar a filha para acabar de vez com todo esse sofrimento. (fls. 116/118).

[...] que considera a criança como sua filha biológica e nem pensa em perder a guarda e convivência com a mesma em virtude desta ser a vida do casal e tem grande laço de afetividade pela mesma. (M. F., “pai adotivo”, fls. 118).

Como ficou claro, a menor foi acolhida sem qualquer contraprestação. Não tinha bens ou herança e, apesar da humildade com que vive esta família, foi tratada como membro legítimo, sem discriminação de nenhuma origem.

Diante disso, se presume que a afetividade familiar, neste caso, foi complemente destituída de vínculo de natureza obrigacional, ou patrimonial. Não houve fim econômico, mas tão somente afetividade.

Isso comprova que a formação do Direito deriva, necessariamente, da evolução natural da sociedade. Constatou-se, com o passar dos tempos, que muitas famílias como esta se formavam exclusivamente pela convivência familiar, independentemente da origem dos filhos.
Essa realidade passou do mundo dos fatos - antes sem qualquer relevância jurídica - para o mundo do Direito, razão pela qual doutrina e jurisprudência, pós Constituição de 1988, vêm reconhecendo que família não é apenas prolongação do ius sanguinis, mas significa principalmente a formação de indivíduos que, fortificados pela convivência, priorizam acima de tudo o bem estar de seus integrantes, mediante laços de afetividade.
Ressalte-se que, sob o ponto de vista jurídico, afetividade não se confunde com o afeto (fator psicológico), mas se constitui como princípio jurídico, cuja força normativa impõe deveres e obrigações aos membros de uma família. A afetividade é o princípio que traduz, no âmbito do Direito das famílias, o princípio da solidariedade.

É a chamada filiação socioafetiva, cujo interesse é a preservação da estrutura familiar, independente da origem, pois são as relações familiares, envoltas por laços afetivos, que merecem e necessitam de proteção especial do Estado (art. 226 da CF).

João Batista Villela[2] afirma que as relações familiares:

[...] por mais complexas que se apresentem, nutrem-se, todas elas, de substâncias triviais e ilimitadamente disponíveis a quem delas queira tomar: afeto, perdão, solidariedade, paciência, devotamento, transigência, enfim, tudo aquilo que, de um modo ou de outro, possa ser reconduzido à arte e à virtude do viver em comum. A teoria e a prática das instituições de família dependem, em última análise, de nossa competência em dar e receber amor.

Maria Berenice Dias[3] ao conceituar as famílias substitutas o faz afirmando que se constituem de um parentesco eletivo, pois:

[...] decorrem exclusivamente de um ato de vontade. Trata-se de modalidade de filiação construída no amor, que gera vínculo de parentesco por opção. A adoção consagra a paternidade socioafetiva, baseando-se não em fator biológico, mas em fator sociológico. A verdadeira paternidade funda-se no desejo de amar e ser amado.

Desse modo, ficou evidente nos autos a existência de um forte vínculo entre a menor e a família substituta, que se consubstancia em perfeito status familiae, tão merecedor de tutela quanto à família formada pela consangüinidade.

Note-se que a mãe biológica da menor, declarando que não dispõe de condições financeiras e não possui qualquer relação de afeto e convívio com a mesma, concorda plenamente que esta permaneça com a família substituta. (fls. 112).

Nesse sentido é também a vontade da menor, uma vez que afirma claramente que [...] sua mãe e pai verdadeiros é a senhora T.J.L e o Senhor F., que os chama de papai e mamãe, ama os dois e quer ficar junto deles [...]. Na oportunidade, relatou-se também que, ao ser questionada sobre o pai biológico, a menor mudou de expressão, ficando tensa e demonstrando medo com relação a este. (fls. 118).

Quanto ao pai biológico, necessário frisar - antes de qualquer análise - que existe uma substancial distinção entre os conceitos de genitor e pai, constituindo-se este como aquele que promove toda a criação da criança, enquanto aquele apenas o que gera.

Segundo Paulo Luiz Netto Lobo[4]:

Pai é o que cria. Genitor é o que gera. Esses conceitos estiveram reunidos, enquanto houve primazia da função biológica da família. [...] Hoje, a paternidade é muito mais que o provimento de alimentos ou a causa de partilha de bens hereditários. Envolve a constituição de valores e da singularidade da pessoa e de sua dignidade humana, adquiridos principalmente na convivência familiar durante a infância e a adolescência. A paternidade é múnus, direito-dever, construída na relação afetiva e que assume os deveres de realização dos direitos fundamentais da pessoa em formação [...] (art. 227 da Constituição). É pai quem assumiu esses deveres, ainda que não seja o genitor.

O autor, conforme se verificou, é mero genitor. Não ficou configurado que este sequer tinha a intenção de formar família, por ocasião da concepção da menor. Ao contrário, conforme relato da mãe biológica, além de não reconhecê-la como filha – apesar da certeza do contrário -, o autor privou-a das condições mínimas de saúde e sobrevivência. Veja-se:

[...] Declarou que quando recebeu a criança, a mesma apresentava sérios problemas de saúde como pneumonia e infecção urinária, estava bastante debilitada, não andava e os ouvidos estavam estourados com secreções e inchaços, parecia que não era alimentada diariamente. (T.J.L. fls. 116).

Assim, não se sustentam as alegações do requerente quanto à conduta e à moralidade dos “pais adotivos”, que nestes autos se mostraram irretocáveis, mas ao revés, se a criança foi descuidada, o foi quando esteve sob os cuidados do requerido e da mãe biológica, conforme provas nos autos.

Por seu turno, além do vinculo sócio-afetivo formado entre a família atual e a menor, observa-se que há outro grande empecilho à entrega da criança ao pai biológico. Averiguou-se que este não reúne o mínimo de condições para promover o desenvolvimento físico e psicológico de uma criança e, certamente, não será uma decisão judicial que o fará tê-las.

Foram apuradas provas da periculosidade do autor, que é evidenciada em várias oportunidades nos autos. A primeira delas, diz respeito à vida pregressa do suplicante. Conforme certidão de fls. 97, este possui dois comunicados de prisão em flagrante e outros dois inquéritos policiais já concluídos (todos os quais já se tornaram processos crimes), sendo um deles inclusive contra os filhos menores de um relacionamento anterior, cuja imputação é o crime de cárcere privado e outros.

O Laudo do Serviço Social é enfático ao concluir que:

[...] pesa sobre o requerente várias acusações de atos de violência e crimes, tais como: espancamentos, tortura, cárcere privado, estupro, maus tratos e falsificação de documentos em tramitação nas varas criminais do Fórum. [...] Observamos que durante todo o nosso estudo, demonstrou ser uma pessoa ora tenso, ora temeroso com informações contraditórias e muito persiste sobre a decisão da guarda da filha [...] não demonstrando equilíbrio emocional.

Em seu meio social, o sentimento com relação ao autor é o mesmo:
[...] O Senhor. A.M. é visto no Bairro como uma pessoa violenta, de má conduta, se envolve com as mulheres somente para maltratar e judiar, [...] e com filhos e que o mesmo deixava as mulheres em cárcere privado e amedrontava as crianças. (fls. 120).

[...] Foi enfática em afirmar que em hipótese nenhuma a justiça deveria autorizar a aproximação da menor com o requerente, mesmo sendo seu pai biológico, a mesma corre risco. (fls. 121).

[...] Informa a Senhora. N. que procurou a justiça para evitar que o Senhor. A.M. mantenha qualquer contato com a criança e faça as mesmas maldades que já fez com outras mulheres e crianças que convivem em sua companhia. Disse que o referido senhor tem inúmeros processos criminais e ainda pratica aos de violência contra as mulheres [...] que faz tratamento no hospital Nina Rodrigues. (fls. 121).

Consta ainda que, foram instaurados contra o requerente incidentes de insanidade mental no curso dos processos nos quais está sendo acusado, o que demonstra ainda mais sua inaptidão para o exercício do poder familiar.

No mais, investigou-se ainda a residência do requerente, do que pôde se apurar que se trata de local sem a menor infra-estrutura para o convívio de pessoas, pois “[...] é tipo salão para comércio, conta com apenas um banheiro sem nenhuma ventilação” (fls. 114), fato corroborado por José Martins, proprietário do imóvel. Veja-se:

[...] lhe declarou que o ambiente que tinha alugado era apenas um pequeno salão adequado para comércio e não para família residir, pois não possuía nenhuma ventilação. (fls. 113).

Assim, todas as provas indicam que o requerente não está habilitado ao exercício do poder familiar, uma vez que acusado de vários crimes, não existindo nenhum motivo suficientemente forte - nem sequer o afeto – que justifique pôr em risco a vida e a integridade física da menor em questão.

Sua situação deve ser analisada com enfoque nos princípios da dignidade da pessoa humana, do melhor interesse e da proteção integral do menor (art. 227, CF[5], e arts. 1º e 3º do ECA[6]), ou seja, em havendo variados fatores a serem apurados, como é o caso, há de ser considerado aquele que melhor represente os interesses e necessidades da criança, inclusive em detrimento aos de seus pais.

A partir disto e, levando em consideração a fragilidade própria da criança, a qual exige mais proteção e atenção do Estado, é que a menor deverá permanecer com T.J.L., a despeito da paternidade biológica do requerido.

Por tudo o que foi dito, verifica-se que a situação do requerente amolda-se claramente na hipótese descrita no artigo 1.635[7] e 1.639[8] do Código Civil, uma vez que este preenche os requisitos descritos nos incisos II, III e IV, tornando-se imperiosa a extinção do poder familiar, para que este não venha mais exercer, em qualquer tempo, algum dos poderes inerentes ao pai.

No que toca aos alimentos, levando em consideração que o exercício do poder familiar ficará extinto, bem como reconhecida a existência de filiação socioafetiva, faz-se necessária a dissolução de qualquer vínculo patrimonial relativamente ao pai biológico, pois não haveria sentido na permanência deste apenas no tocante a este aspecto.

Por fim, quanto ao nome da menor, por tratar-se de direito da personalidade, uma vez que este a acompanha desde os 02 (dois) anos de idade, representando, portanto, sua identidade e a forma como é reconhecida socialmente e, ainda, diante da concordância das partes, esta deverá ficar com o nome de I. D. S. M.

Ante o exposto, levando-se em consideração as provas carreadas aos autos julgo procedente a presente ação, para declarar a paternidade alegada, nos termos da Lei 8.560/92 e dos artigos 27 da lei 8.069/90, 1.607 e seguintes do Código Civil, devendo para tanto, ser cancelado o registro de nascimento de fls. 60 e averbado o registro constante às fls. 70, para modificar o nome de G. M. para I. D. S. M.

No entanto, pelas razões já expostas decreto a perda do poder familiar de A. M., nos termos do artigo 1.635, V c/c 1.638, II, III e IV do Código Civil e, consequentemente torno definitiva a guarda da referida menor para T. J. L., inteligência dos artigos 33 e parágrafos da Lei 8.069/90.
Lavre-se o termo de guarda, responsabilidade e compromisso, a ser assinado por Terezinha de Jesus Leite, o que deve constar dos autos, como dispõe o artigo 32 do citado estatuto, ressaltando-se que, ao receber este encargo, esta será a legítima representante da menor para todos os fins de direito, inclusive para opor-se aos pais, conforme o caso.
Oportunamente, e sob as cautelas legais, arquive-se, fazendo-se as anotações necessárias.
Sem custas.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
São Luís, 26 de fevereiro de 2009.

José de Ribamar Castro
Juiz de Direito
1ª Vara de Família
[1] Art. 329. Ocorrendo qualquer das hipóteses previstas nos arts. 267 e 269, II a V, o juiz declarará extinto o processo.
Art. 269. Haverá resolução de mérito:
[...]
II - quando o réu reconhecer a procedência do pedido

[2] Villela, João Batista. As novas relações de família. Anais da XV Conferência Nacional da OAB, 1994.
[3] Dias, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed. 2005
[4] Diretor Nordeste do IBDFAM. Doutor em Direito Civil pela USP. Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça. In: PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E A VERDADE REAL.

[5] Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[6] Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
[7] Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:
[...]
V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.
[8] Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I – [...]
II - deixar o filho em abandono;
III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

IMPUGNAÇÃO: BEM DE FAMILIA

Processo n°.
Impugnante/executado: M. A
Impugnada/exeqüente: F. O

Vistos etc.

M. A, já qualificado, inconformado com a penhora efetivada às fls. 171, interpôs incidente de impugnação, nos autos da ação de reconhecimento e dissolução de união estável que move contra si F.O, com fulcro nos artigos 475-L e seguintes do CPC, em razão dos seguintes fatos:

Relata o autor que a penhora efetuada é incorreta, uma vez que recaiu sobre bem de família, sendo imóvel residencial, cuja impenhorabilidade é protegida por lei.

Alega ainda, que já entregou à requerente o objeto do acordo, quais sejam,04 (quatro) quitinetes, estando a impugnante na posse das supracitadas.

Fundamenta seu argumento com os dispositivos da Lei 8.009/90, requerendo, por fim, a procedência do pedido, com a concessão de efeito suspensivo e a procedencia da presente impugnação com o cancelamento da penhora do imóvel situado à rua Rodrigues Fernandes (atual rua do passeio) .

Manifestação da exequente às fls. 192/197.

É o relatório.

Com fundamento no princípio do sincretismo processual, trazido pela Lei n. 11.232/2005 - segundo o qual não há mais separação entre cognição e execução - foi criada a impugnação, espécie de defesa incidental do executado e consequência lógica da referida reforma, eis que, diferentemente dos embargos, é interposta sem a necessidade do ajuizamento de ação autônoma.

Assim, passou o executado a contar com a celeridade imposta pelo novo procedimento, no qual, porém, a atividade jurisdicional fica restrita apenas à verificação da existência e validade dos requisitos da execução, face à imutabilidade da coisa julgada (art. 474 CPC)[1], operada na fase cognitiva.

DO CASO EM CONCRETO

O imóvel do executado foi penhorado para garantir o cumprimento de sentença na qual acordaram que a requerente ficaria com 04 (quatro) quitinetes , localizadas na Rua 0), São Francisco.

Ocorre que as quitinentes, até os dias atuais, não foram transferidas, visto não serem legalizadas.

Diante do exposto, a requerente pleiteou a sustituição dos imóveis supracitados pela metade do imóvel indicado às fls.103, face o princípio da fungibilidade.

Sendo deferido por este juízo a penhora da metade do imóvel localizado às fls. 103.

Interposição de impugnação no prazo legal (fl. 188), tendo por base o inciso III do artigo 475 – L do CPC[2], justificada com o argumento de ser impenhorável o imóvel constrito, por ser bem de família, protegido que está pela Lei 8.009/90 e com fulcro também no inciso.

Ocorre que o caso em análise não está coadunado ao preceito em referência. Senão vejamos:

Com efeito, penhora incorreta ou irregular é aquela levada a efeito em afronta a disposição legal, quer no aspecto material, quer no aspecto formal, nela incluída, a priori, o bem de família. Assim, preenchidos os requisitos previstos em lei para caracterização do bem de família, não poderia haver expropriação, nos termos do artigo 475-L, III do CPC.

Inicialmente, insta tecer breves considerações sobre a impenhorabilidade do bem de família e os elementos necessários a considerar um determinado bem como tal.

Dispõe o art. 1º da Lei 8.009/90:

Art. 1º. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei.

Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

O dispositivo não exige que o casal tenha apenas um imóvel, exige é que nele resida. A exigência é de que, para que seja considerado como bem de família, o imóvel deve servir como local de residência do proprietário e de seus familiares.

Há equivocada idéia de que deve ser o único imóvel de propriedade do executado, mas não é essa a exigência da lei. O que ela estabelece é que, se ele tiver duas residências, apenas uma será considerada bem de família.

O equívoco é de plano esclarecido perante o que dispõe o art. 5o da mesma lei:

Art. 5º. Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta Lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.

Parágrafo único. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do artigo 70 do Código Civil.

O parágrafo único do Art. 5º é cristalino ao reconhecer a impenhorabilidade quando o devedor possuir mais de um imóvel e ainda resolve a questão, determinando que, nesse caso, a impenhorabilidade recairá sobre o imóvel de menor valor.

Observa-se dos autos que o bem penhorado é mesmo de propriedade do embargante. No mesmo diapasão, ficou claro nos autos que o embargante não reside no logradouro do bem penhorado, mormente pelo fato de que seu endereço residencial para intimações é diferente do endereço do imóvel constrito, conforme pode se extrair das certidões do oficial de justiça, fls.36, 46, 65 e da procuração advocatícia de fls.83, aonde declara expressamente que reside na Rua Virgílio S/N, São Francisco, nesta comarca.

O documento de f. 103 apenas atesta a propriedade do imóvel penhorado, mas não se presta a comprovar que o embargante ali reside. Se o imóvel em que reside atualmente é alugado (e não há provas disto) pouco importa, uma vez que mesmo se assim considerarmos, não vislumbro a presença de um dos elementos caracterizadores da impenhorabilidade: a necessidade de utilização do bem penhorado para fim residencial do proprietário ou de seus familiares ou de sua renda para cobrir o aluguel de onde reside.

Para que o imóvel locado pode ser considerado bem de família há de ficar comprovado que o valor do aluguel é essencial para o pagamento de outro imóvel. Não é o que aqui ocorre, posto não haver nenhuma alegação nesse sentido.

No caso em questão não vislumbro a presença de nenhum dos dois elementos que caracterizem o imóvel como bem familiar, quais sejam, a efetiva utilização do bem como local de moradia e nem a utilização do valor do imóvel para custear o aluguel do local aonde reside, motivos pelos quais não devem prosperar a presente impugnação.

Isto posto, julgo improcedente a impugnação interposta por M.A, contra a penhora efetuada às fls. 170/172, nos autos que promove contra si F. O, para determinar o prosseguimento da execução, deferindo, via de conseqüência, o pedido de adjudicação (fls. 140) do bem penhorado, metade do imóvel localizado à rua do passeio, nos moldes do artigo 685-A e seguintes do CPC e o faço com fulcro na Lei n. 8.009/90, artigos 1.723 e seguintes do Código Civil e nos demais princípios constitucionais que tutelam a boa-fé e a entidade familiar da união estável.

Lavre-se o auto de adjudicação e a respectiva carta.

Publique-se. Intimem-se.

São Luís, 09 de janeiro de 2009

José de Ribamar Castro
Juiz de Direito
1ª Vara da Família

[1] Art. 474. Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.
[2] Art. 475-L. A impugnação somente poderá versar sobre:
[...]
III – penhora incorreta ou avaliação errônea;