sábado, 18 de agosto de 2007

Alimentos pagos por Avó

Processo n.º
Requerente: M.M
Requerido: A. G.
Ação de Alimentos

Vistos, etc.

Cuida-se de Ação de Alimentos promovida por M. M, representando sua filha incapaz, M. G, através de advogada constituída, contra o avô paterno N. G, devidamente qualificados na inicial de fls. 02/13.

Aduz a requerente que M G, filha e neta dos litigantes, é maior, porém incapaz, em virtude de ser portadora de Síndrome Atáxica Axial congênita, o que a impede de locomover-se sozinha, sendo dependente nas atividades cotidianas e necessitando de cuidados especiais.

Que fora fixada por ocasião do divórcio de M. M. e N.G, filho do requerido, à título de alimentos, o percentual de 40%(quarenta por cento) dos vencimentos em favor dos filhos do casal.

Que o pai, como vastamente documentado, de há muito não cumpre de forma satisfatória sua obrigação alimentar, por razões diversas, mormente que se encontra desempregado. Destarte, a requerente propôs a ação de execução de alimentos nº contra o pai de sua filha com o objetivo de regularizar os pagamentos devidos.
Desse modo, em virtude da impossibilidade do pai de arcar com sua obrigação alimentar, a autora entrou com o presente pedido de alimentos em desfavor do avô.
O pedido veio instruído com os documentos de fls. 14/94.

Recebida a inicial, foram fixados, em favor da requerente, alimentos provisórios no percentual de 25%(vinte e cinco por cento) dos rendimentos do requerido, deduzidos os descontos compulsórios.

Devidamente citado, o requerido propôs um acordo, onde passaria a pagar à título de alimentos a quantia de 500 R$(quinhentos reais) em favor de sua neta.
Contudo a parte autora não concordou com a proposta apresentada, pois alegou que o avô paterno possui uma boa condição financeira enquanto sua filha está precisando de sérios cuidados médicos, demandando gastos essenciais de toda ordem, como uso de medicação controlada, aulas de hidromassagem e tratamento com fonoaudióloga.

Em audiência de fls. 130/131, foi apresentada defesa de fls. 132/137, onde o requerido, em suma, alegou que não mais cabe o presente pedido, posto seu fillho está trabalhando regularmente, como professor de uma escola de inglês, podendo agora arcar com suas despesas, mormente a obrigação alimentar para com sua filha e alegou ilegitimidade para a causa, devendo a presente ser extinta sem resolução de mérito.
Ato contínuo, foi apresentada réplica onde a autora rebateu as alegações acerca do novo emprego em comento e, outrossim, reforçou a necessidade de o avô continuar a ajudar nos cuidados de sua filha.

Alegações finais às fls. 162/174; 179/181.

Em parecer de mérito, o M. Público opinou pela fixação à título de alimentos definitivos o percentual de 15%(quinze por cento) dos rendimentos líquidos do avô.
É o relatório. Decido.

Observa-se nos autos que o móvel ensejador da presente Ação de Alimentos, se prende tão somente ao fato de N. G, pai da incapaz, não só protelar, mas utilizar de recursos para eximir-se do pagamento alimentício a que foi obrigado, quando do seu divórcio com M.M, em 1993.

Ante a essa situação foi intentada a Ação de Execução Almentícia, Processo nº, tendo o executado utilizado, conforme referido nos autos, de vários recursos para não assumir o encargo alimentar, juntando inclusive, rescisões de contrato e informação de não oportunidade de trabalho, embora empreendesse esforços nesse sentido.

Em contraponto a ação executiva, promoveu o executado, em janeiro de 1999, a Ação de Revisão de Pensão Alimentícia, Processo nº, argumentando não pagar os alimentos devidos por falta de emprego.
Ressalta-se de forma inquestionável nos autos a manifesta vontade de N. G, eximir-se do encargo quanto aos alimentos, levando por via de conseqüência e com base no príncipio da solidariedade familiar, conforme estatui o artigo 1698 do Código Civil, ser acionado o avô paterno de M. G, N. G, objeto da presente lide.

A obrigação alimentar entre ascendentes e descendentes funda-se no vínculo da solidariedade que liga os membros da família, impondo aos parentes o dever recíproco de prestação quanto aos alimentos.

O Código Civil é claro:

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Art. 1.697. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais.
Assim, “os sujeitos da relação jurídico-alimentar, portanto, não se colocam apenas na condição de pai e filho; estabelece-se, do mesmo modo, uma obrigação por alimentos entre os filhos, genitores, avós e ascendentes em grau ulterior(em linha reta inexiste qualquer limite de grau), caracterizada pela reciprocidade”[1].
Na mesma trilha, a Desembargadora Maria Berenice Dias[2] ressalta a importância da prestação de alimentos ao afirmar que:

No âmbito das relações de família, os alimentos são devidos por vínculos de parentalidade, afinidade e até por dever de solidariedade, comportando classificações segundo diversos critérios. A imposição do dever alimentar busca preservar o direito à vida, assegurado constitucionalmente (CF 5º). Os alimentos não dizem apenas com o interesse privado do alimentante. Há interesse geral no seu adimplemento, por isso se trata de obrigação regulada por norma cogente de ordem pública.

Como vastamente exposto, a legislação civil traz uma ordem sucessiva do chamamento à responsabilidade, preferindo os mais próximos aos mais remotos, e só fazendo recair a obrigação nos mais remotos ante à falta ou impossibilidade daqueles de prestá-los.

No caso em tela, resta consubstanciado nos autos que a parte autora de há muito vem sendo prejudicada pelas constantes alegações e sem a devida comprovação de desemprego por parte do ex-companheiro, de forma que tem custeada sozinha os cuidados da filha do casal. Por outra via, o simples fato desemprego que tem servido de óbice não o exime de qualquer forma do encargo alimentar.

A impossibilidade financeira do pai, legitimadora para a presente ação, encontra-se de certa forma patente nos autos, bem como no processo de execução em apenso (Proc. nº).
Destarte, a responsabilidade complementar do avô paterno, condição subsidiária, é medida que se impõe ante aos fatos já aduzidos e ainda, o inquestionável grau de necessidade da neta, que conforme documentação acostada, necessita de vários cuidados especiais, como fonoaudióloga, remédios e aulas de hidromassagem para melhorar sua coordenação motora e qualidade de vida.
Nesse diapasão a jurisprudência pátria:

AÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE ALIMENTOS INTERPOSTA CONTRA O AVÔ PATERNO - COMPROVADA INCAPACIDADE DO GENITOR EM CUMPRIR COM A OBRIGAÇÃO ALIMENTAR - DEMONSTRADA A POSSIBILIDADE DO AVÔ PATERNO EM CONTRIBUIR COM O SUSTENTO DOS NETOS - RECURSO DESPROVIDO PARA MANTER A R. SENTENÇA.(TJ MG)

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE ALIMENTOS – ILEGITIMIDADE PASSIVA ""AD CAUSAM"" DOS AVÓS – INOCORRÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE DO PAI CONCEDER PENSÃO ALIMENTÍCIA AO FILHO – ARTIGO 1.696, DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO – NECESSIDADE DO ALIMENTANDO – FALTA DE INTERESSE DE AGIR – INOCORRÊNCIA - AÇÃO DE ALIMENTOS INTENTADA SOMENTE CONTRA AVÓ PATERNA – POSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA.1 – Conforme disposto no artigo 1.696, do Código Civil, o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, inclusive aos avós paternos, quando o pai não possuir rendimentos, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros, sendo, portanto, a avó paterna parte legítima para figurar como destinatária do pedido formulado por seus netos. 2 – Se o pai, por si só, revela impossibilidade de recursos para alimentar os filhos menores, podem esses pedir alimentos aos avós paternos e/ou maternos, em melhores condições econômicas, tendo em vista a suficiente demonstração e comprovação do binômio necessidade-possibilidade. 3 – Não é necessário que a ação de alimentos seja intentada tanto contra avós paternos quanto contra avós maternos. Pode a ação ser intentada somente contra a avó paterna, tendo em vista que o litisconsorte que poderia ser instaurado no pólo passivo é o facultativo e não o necessário, pois a obrigação de alimentar não é solidária. 4 – Preliminares rejeitadas. Recurso a que se nega provimento.(TJ MG)


Desse modo, fica afastada a alegação de ilegitimidade para a causa do avô quanto à prestação de alimentos, na maneira como alegada, devendo para tanto este, ante, a relação de parentesco, complementar no âmbito de sua possibilidade, com os alimentos que são necessários a neta, uma vez que o pai a quem caberá a obrigação primeira, se escusar constantemente desse encargo, conforme pode-se verificar em autos de Execução de Alimentos, nessa Vara.

Atento ao princípio da proporcionalidade, imprescindível a quantificação dos valores dos alimentos, e diante da necessidade da alimentada e possibilidade do avô alimentante, que é Capitão, há que se julgar procedente o pedido para fixar em definitivo os alimentos pugnados.

Com vistas dos autos, a representante do Ministério Público em parecer de mérito devidamente fundamentado opinou: “Neste diapasão, apesar da aparente ilegitimidade passiva apresentada, presente a urgente necessidade da incapaz pela decretação dos alimentos, e comprovado que o pai utiliza-se de vários subterfúgios para não cumprir com o seu dever alimentar, e finalmente também comprovada a possibilidade do avô em arcar com os aliimentos sem desfalque ao seu necessário, opinou este Membro Ministerial que sejam fixados á título de alimentos definitivos o percentual de 15%(quinze por cento) dos vencimento líquidos do avô, devendo, por conseguinte se fazer a citação do pai da incapaz para fazer parte do pólo passivo da ação com litisconsorte, e prosseguimento do feito frente ao pai”

Diante do exposto, julgo procedente, em parte, o pedido formulado pela autora, para fixar em alimentos definitivos a serem pagos por A G, em favor de sua neta M. M, o percentual de 15%(quinze por cento) dos seus rendimentos, deduzidos os descontos compulsórios, a serem depositados na forma como vem ocorrendo.

Oficie-se ao Órgão Empregador.

Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no percentual de 10% do valor da causa.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

São Luís, 12 de abril de 2007.

José de Ribamar Castro
Juiz de Direito
1ª Vara de Família



[1] CAHALLI, Yussef Said, Dos alimentos. 4.ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p 675.
[2] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005, p. 450.

Um comentário:

Unknown disse...

Gostei muito da matéria, pois estava com dúvidas sobre a matéria. Sou estudante de direito, estou estagiando e estou com uma inicial à respeito do assunto.